• Percival Puggina
  • 22/10/2020
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VIVER PERIGOSAMENTE

 

 Minha geração viveu a inteira experiência da Guerra Fria. Conflito Leste-Oeste, Organização do Tratado do Atlântico Norte versus Pacto de Varsóvia, armamento nuclear abarrotando arsenais em quantidade suficiente para destruir o planeta várias vezes, corrida espacial. Minha geração viveu décadas com medo da “bomba”. Por fim, a estrepitosa queda do Muro de Berlim e a extinção da URSS. Ao mesmo tempo em que isso acontecia no lado visível do palco, no bastidor os derrotados se infiltravam tomando o controle dos meios culturais do Ocidente e agindo no sentido de destruir a cultura e os valores que se haviam revelado vencedores. Deu muito certo.

No Brasil não foi diferente. O processo constituinte de 1987/88 abriu o caminho para os derrotados pelo regime militar chegarem ao poder. Os meios culturais já estavam dominados de tal forma que, enquanto a caneta aparelhava as instituições, os recursos da União financiavam os meios de influência. Como resultado, passou-se a viver perigosamente no Brasil, com um nível de insegurança de nações em guerra. Mas isso não importa aos poderes da República. Só condutas que possam ser identificadas como politicamente incorretas suscitam a fúria das Cortes. Para tudo mais vige o estímulo da impunidade.

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Quem tem um STF e um Congresso Nacional com a atual configuração de forças não precisa do Partido Comunista da China para difundir insegurança à população. Conseguimos perfeitamente bem protagonizar nossos próprios medos e custear o conforto de quem lhes dá causa. Não contentes com a carnificina, os assaltos, sequestros, estupros e furtos do quotidiano, nossos ministros do Supremo libertam as forças do mal soltando bandidos perigosos. Para fazer isso com a consciência tranquila e dormirem bem à noite, no dizer vaidoso de Marco Aurélio Mello, concedem-lhes habeas corpus às centenas “sem olhar a capa dos processos”. Perfeito! Adotam o princípio rotariano de fazer o bem sem olhar a quem. Sei, sei. “Impunidade”, este é o nome do jogo, que também se poderia chamar “Como produzir mais vítimas com o mesmo contingente de bandidos”.

Nosso Senado Federal é formado por 81 senadores com a prerrogativa constitucional de pôr fim a esse escárnio, contanto que o queira. No entanto, não se consegue mais de vinte e poucas assinaturas para qualquer ação efetiva de legislar em favor da sociedade e contra o crime. Setenta e cinco por cento dos senadores querem tudo exatamente como está, com todas as garantias e chicanas para criminosos que, não raro, são eles mesmos. Aliás, quando o Congresso Nacional legisla para abrandar o Código Penal e embutir, contra o interesse da população, mais alguma treta no Código de Processo Penal, ele comete o ato moralmente reprovável de legislar em benefício próprio. Não há como não pensar nisso. Aliás, nenhum parlamento de país democrático considera tal prática compatível com a dignidade do poder.

É nesse perigoso contexto que a República Popular da China vem se aproximando do Brasil, cheia de amor para dar. Fora do Partido Comunista da China (PCC), ninguém no mundo confia no Partido Comunista da China. O Brasil, no entanto, esteve a um passo de disponibilizar a vacina chinesa contra o vírus que, oriundo de lá, fez enorme estrago nos sistemas de saúde pública e na economia mundial. Felizmente, o presidente transferiu para a Anvisa a responsabilidade de aprová-la ou não.

Por outro lado, a tecnologia 5G está determinando uma disputa entre EUA e China que está sendo comparada pela diplomacia brasileira com episódios comuns ao tempo da Guerra Fria. Multiforme, ela volta, repaginada, em versão sino-americana, com acirrada disputa pela supremacia econômica e tecnológica. Há sempre um lado totalitário assombrando o planeta. Comunismo, globalismo, terrorismo são enfermidades morais que só a democracia consegue sanar.

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* Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.
 


Larry de Camargo Vianna Nascimento -   26/10/2020 19:25:33

Definitivamente o Brasil não é para amadores ! Tanto STF, CONGRESSO NACIONAL E O GOVERNO FEDERAL (TEMPOS PETISTAS) tripudiaram no povo. Ainda temos grandes desafios para recolocar o Brasil nos eixos. Na primeira votação pós petismo temos a chance de iniciar o expurgo desta gente nefasta. Sem eles iremos iniciar uma reviravolta em direção a Democracia. É duro tirar estes comunas do poder.

ODILON SILVEIRA SANTOS ROCHA -   26/10/2020 15:53:40

Excelente, caro Professor. No alvo. Parece que as postedades aristocráticas GLOBALISTAS não vão arredar o pé da agenda 2030. Dez anos passa rápido e permite ajustar direitinho o protocolo de "intenções". Essa é a guerra mundial.

Paulo Roberto de Almeida -   26/10/2020 11:21:08

Caro Puggina, tens inteiramente razão quanto à disposição de nossos legisladores de se protegerem a si próprios dos braços da lei, aumentando com isso a insegurança geral dos cidadãos e da sociedade como um todo. Mas sinto que o seu desconhecimento concreto do que seja a China atual o leve a posturas identificadas com uma era da Guerra Fria que já se encerrou, especialmente em temas relevantes para o Brasil, como vacina ou plataformas de comunicação. A China continua a ser um Estado autocrático, mas é, ao mesmo tempo, a maior potência capitalista do planeta. Tendo residido na China e estudando profundamente suas características atuais, poderia falar com conhecimento de causa sobre o que isso significa para a redução da pobreza em todo mundo e sinto que vc interprete mal certas características do capitalismo contemporâneo. A China é a única potência atual que defende livre comércio e globalização, que supostamente são valores liberais de mercado. O jogo econômico atual não pode mais ser interpretado segundo as viseiras da Guerra Fria. Há um debate importante em torno disso. Meus cumprimentos. Paulo Roberto de Almeida

FERNANDO A O PRIETO -   23/10/2020 09:00:16

Como de costume, muito bom e esclarecedor! É preciso termos consciência de que podemos e devemos desempenhar um papel (embora, na maioria das vezes, pequeno) nessa "guerra cultural", jamais deixando de manifestar nossa desaprovação a essas teorias "politicamente corretas", quando isso for possível, ou, quando não for, pelo menos não as apoiando. Que Deus nos oriente quanto às ações mais apropriadas contra as forças do mal, que tem agentes CONSCIENTES (Partido Comunista, Islamismo militante, apenas para dar alguns exemplos) e INCONSCIENTES de seu papel real (inocentes úteis).

André Andersen -   22/10/2020 14:46:30

Exatamente isto, é o que sinto. Seu texto, assim como aquele de Guzzo, que a Veja negou-se a publicar, deveriam ser divulgados aos 4 cantos do país. Parabéns pela clareza e precisão.

Menelau Santos -   22/10/2020 11:27:13

Prezado Professor, obrigado pelo maravilhoso artigo. É complicado viver num país em que os bandidos legislam e julgam-se a eles mesmos.