• Revista Veja
  • 11/01/2009
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SOB O ?IO DOS VIZINHOS

Jaime Klintowitz Se a contagem do tempo come? pelo ano em que o primeiro grupo armado foi organizado pelos judeus para proteger suas povoa?s de salteadores ?bes, em 1909, judeus e ?bes engalfinham-se pela posse da Palestina h?elo menos 100 anos. Nesse s?lo de atrocidades m?s, cada lado tem sua parcela de culpa no fato de se passar tanto tempo procurando um caminho para a paz quando a paz deveria ser o caminho. Por que a paz n?encontra quem a patrocine naquela regi? As causas da guerra no Oriente M?o s?de natureza diversa – ?ica, religiosa, geopol?ca e ideol?a. Elas se interpenetram de tal modo que a solu? de uma acaba agravando a outra. O resultado ?ue todas as chances de paz foram abortadas por um lado ou outro – mais recentemente sempre pelos palestinos e pelos pa?s ?bes que lhes d?apoio. H?uas semanas, Israel est?e novo oficialmente em guerra com um de seus vizinhos. J?steve em 1948, ano de sua cria? como estado independente, em 1956, 1967, 1973, 1982 e 2006. Israel venceu todas essas guerras, mas as vit?s militares acabaram produzindo novas complica?s e adiando ainda mais a solu? definitiva para o conflito. As duas semanas de ofensiva militar israelense na Faixa de Gaza, com todos os seus horrores, podem facilmente ser vistas como mais uma erup? de viol?ia dessa rixa cr?a. Afinal, esta ? quarta vez que tropas israelenses invadem a Faixa de Gaza, uma nesga de solo arenoso, superpovoada e muito pobre, desde 1948. Da pen?ma vez, a ocupa? se prolongou por 38 anos, s?rminando em 2005. O conflito ser?ais bem compreendido, no entanto, se for examinado pelo que tem de diferente dos anteriores. Essa n??ais uma guerra ?be-israelense. Nem sequer se pode falar em conflito israelo-palestino, j?ue metade da Palestina n?est?om o Hamas, disse a VEJA o paquistan?Kamran Bokhari, diretor de pesquisas sobre o Oriente M?o da Stratfor, uma consultoria de geopol?ca com sede nos Estados Unidos. Muitos palestinos na Cisjord?a entendem que o Hamas ?arte do problema. O Hamas ?ma organiza? radical isl?ca, dominada pelo fanatismo e que usa m?dos terroristas. Seus l?res s?proponentes do jihadismo, o movimento cujo objetivo mais geral ? guerra santa em nome do Isl? cujo objetivo mais espec?co ? destrui? do Estado de Israel. O Hamas domina cora?s e mentes em Gaza. Tem, portanto, legitimidade pol?ca. Essa ? trag?a. O Hamas n?pode ser derrotado militarmente. A diversidade na Palestina ?aior do que aparenta ser. Vivem ali v?as confiss?religiosas – crist?, drusos e, naturalmente, judeus –, mas o Hamas sustenta que o territ? deve ser um peda?exclusivamente mu?mano de um futuro imp?o isl?co. Isso sinaliza a ascens?de um novo complicador no conflito centen?o. Apesar de contrapor judeus a mu?manos, a disputa at?gora tinha sido basicamente laica, de cunho nacionalista, sobre quem era ou n?um povo e qual deles tinha ou n?direito a um estado pr?o. O Hamas ?m fiel escudeiro do Ir?que lhe fornece armas (a? origem dos m?eis lan?os da Faixa de Gaza contra cidades israelenses), treinamento militar e dinheiro. Ainda que em microdimens?e por meio de intermedi?os, o ataque ao Hamas pode ser visto como uma esp?e de guerra por procura? – na defini? do historiador israelense Benny Morris, da Universidade Ben-Gurion, em Beersheba – entre Israel e os aiatol?de Teer? Os iranianos podem muito bem ter incentivado o Hamas a rejeitar a renova? do cessar-fogo – e a iniciar o insano foguet? que atraiu a devastadora rea? militar – para desviar a aten? dos israelenses, que pareciam estar se preparando para um ataque preventivo ?instala?s nucleares do Ir?H?stimativas de que os iranianos estejam a dois ou tr?anos de obter sua primeira bomba nuclear. Israel sabe que os jihadistas n?s?totalmente racionais. Ou, pelo menos, n?da forma como se v?m governos respons?is, cuja preocupa? primordial s?a seguran?e a prosperidade de seu povo. A amea?de aniquila? m? garantiu o equil?io entre o Kremlin e a Casa Branca durante a Guerra Fria. Devido ?ixa? mental no autossacrif?o e no mart?o, san?s e repres?as n?funcionam t?bem com os aiatol?iranianos ou com os xeques do Hamas. Se Teer?iver a bomba nuclear, ?rov?l que decida us?a, seja por motivos ideol?os, seja por medo de que Israel, que tem um formid?l estoque de armas nucleares, possa atacar primeiro. Meses de bloqueio israelense e san?s estabelecidas pelos Estados Unidos, Uni?Europeia e Egito n?conseguiram fazer com que o Hamas moderasse sua demagogia religiosa e seu discurso racista – raz? por sinal, da imposi? de san?s. Depois de uma tr?a tensa que durou seis meses, o movimento isl?co se p? disparar foguetes sobre as cidades israelenses para demonstrar que a jihad est?iva e em boa forma. Por certo n?tinha ilus?de que a repres?a era inevit?l e seria, como de h?to, devastadora. Fiel ao culto do mart?o, o Hamas agiu diligentemente para atrair a formid?l m?ina de guerra israelense para as vielas apinhadas das cidades e favelas de Gaza, onde acreditava que seria mais f?l combat?a. As mortes e a destrui? causadas pela ofensiva israelense s?dolorosas de observar. Na ?ma sexta-feira, as estimativas eram de 750 palestinos mortos, entre os quais uma quantidade enorme de crian?. S? ataque a uma escola da ONU repleta de refugiados foram mortas quarenta pessoas. Fam?as inteiras acabaram dizimadas por bombardeios a?os. Uma proposta de cessar-fogo apresentada pelo Conselho de Seguran?da ONU foi rejeitada por ambas as partes na sexta-feira passada. Baz Ratner/Reuters O LONGO BRA? DO HAMAS M?e filhos se protegem em kibutz de foguetes palestinos lan?os de Gaza O conflito em Gaza aprofundou o cisma regional entre a fac? da resist?ia – que inclui o Ir?a S?a e suas mil?as aliadas, o Hezbollah no L?no e o Hamas na Palestina – e os chamados moderados, favor?is ?az negociada com Israel. Esse grupo ?ormado pela maioria dos pa?s, encabe?os por Egito, Jord?a, Ar?a Saudita e pela Autoridade Palestina na Cisjord?a. Alguns deles, como o Egito, com o qual Gaza faz fronteira, criticaram abertamente o Hamas por provocar o conflito. O governo eg?io n?tolera a conex?entre o Hamas e a Irmandade Mu?mana, o principal movimento de oposi? no pa? A Ar?a Saudita apoia quase abertamente qualquer coisa que os israelenses fa? para conter a influ?ia dos xiitas do Ir?o Oriente M?o. O primeiro pelot? o da rejei?, tem a esperan?de que o Hamas sobreviva ao ataque em condi?s de demonstrar que Israel n??apaz de esmagar todos os seus inimigos. O segundo grupo torce descaradamente pela derrota do extremismo isl?co em Gaza. O mesmo debate est?ceso entre os palestinos, a ponto de o presidente Mahmoud Abbas ter a ousadia de responsabilizar o Hamas pelo in?o da guerra. Quando Israel se retirou unilateralmente da Faixa de Gaza, em 2005, deu aos palestinos a oportunidade de demonstrar sua capacidade de gerir o pr?o estado. Tr?anos e meio depois, est?laro que os palestinos falharam em seu objetivo. Eles preferiram investir na constru? de t?s e no contrabando de armas a financiar um bom governo para a popula? palestina, diz o historiador Benny Morris. As condi?s de vida na Faixa de Gaza continuaram miser?is. Metade dos trabalhadores est?em emprego e sete em cada dez dependem de doa?s internacionais para se alimentar. A ajuda minguou depois da vit? do Hamas nas elei?s de 2006. Os Estados Unidos e a Uni?Europeia, que t?o grupo em sua lista de organiza?s terroristas, cortaram linhas de financiamento ?egi? As chances de criar um estado palestino se tornaram mais remotas depois do golpe militar que expulsou o Fatah de Gaza. Desde 2006, cerca de 750 palestinos morreram em lutas fratricidas – n?o semelhante ao das mortes causadas pelos ataques israelenses. SOFRIMENTO Milhares de palestinos rezam pelas v?mas do ataque israelense que atingiu uma escola da ONU (no alto, ?ir.). esquerda, pai reconhece o corpo do filho na Cidade de Gaza. direita, rob?raelense checa o corpo de um palestino morto ao tentar explodir um posto de gasolina em assentamento judeu na Cisjord?a Curiosamente, essa realidade multifacetada tornou-se preto-e-branco na rea? da imprensa, dos diplomatas e da maioria dos governantes. Israel ?asicamente considerado um estado truculento, que – esta ? opini?expressa pelo governo do presidente Lula – reagiu de forma desproporcional aos foguetes do Hamas. O argumento baseia-se bastante na discrep?ia de baixas (catorze israelenses mortos at? sexta-feira passada). Essa ?ma conta dif?l de ser feita por quem considera que cada vida ?reciosa. Na verdade, o estado judeu n?est?espondendo aos proj?is lan?os nas ?mas duas ou tr?semanas, mas a anos de ataques indiscriminados contra os 750 000 israelenses que vivem pr?os ?ronteira com a Faixa de Gaza. A ofensiva contra o Hamas est?endo realizada com for?poderosa e agressividade t?ca, estrat?a militar cujo objetivo ?eduzir as pr?as perdas e esmagar o inimigo. N??ssim que se ganham as guerras? Trata-se de um estado soberano defendendo sua integridade e seus habitantes, disse a VEJA Paul Scham, que ensina hist? israelense na Universidade de Maryland, nos Estados Unidos. ?paradoxal, mas n?inesperado, que Israel, a ?a democracia do Oriente M?o, esteja perdendo gradualmente a simpatia da opini?p?ca no exterior. A malha?, antes confinada ?xtrema esquerda, tornou-se parte integrante do populismo antiocidental. Muitos partidos de esquerda agora consideram o antissionismo como um pr?equisito para seus afiliados e n?se acanham em denunciar a conspira? judaica, na melhor tradi? antissemita. Por que a esquerda europeia, e globalmente toda a esquerda, est?bcecada em lutar contra as democracias mais s?as do planeta, Estados Unidos e Israel, e n?contra as piores ditaduras?, questionou em uma palestra a jornalista catal?ilar Rahola, que j?oi deputada de esquerda na Espanha. O conflito entre ?bes e judeus na Palestina ?m n?f?l de desatar. Oportunidades de paz foram perdidas por ambos os lados e nada indica que se esteja mais perto de uma solu? – ainda que todo mundo concorde que, quando dois povos disputam o mesmo peda?de terra, a melhor solu? ?ividi-la em dois pa?s. O que ?ora de d?a ?ue Israel n?pode (e n?vai) perder a guerra contra as for? da intoler?ia religiosa no Oriente M?o, representada agora pelos terroristas do Hamas. Israel ?ma sentinela avan?a da democracia e da civiliza? judaico-crist?ercada por na?s e grupos pol?cos armados que formal e claramente lutam pela destrui? do estado judeu e pela morte de todos os seus habitantes n??bes. Tamb??ora de d?a que n?haver?az enquanto os vizinhos hostis n?aceitarem que a exist?ia de Israel ?eg?ma, que o pa?tem o direito de se defender e que o terrorismo destr? que pretende construir. Com reportagem de Thomaz Favaro e Duda Teixeira http://veja.abril.com.br/140109/p_052.shtml