Instalou-se no Brasil um estresse político que, mantido, conduzirá a um final infeliz. Ou seja, a tensão está aumentando e arrastando a nação a um estágio cada vez mais crítico. Não haverá solução boa pelo caminho das picuinhas e da crescente violência verbal e comportamental.
O quadro é alarmante. Chega-se ao fim de cada dia abastecido de notícias que amplificam os sentimentos de pânico, medo, revolta, e de uma raiva que arde no peito e clama pelo mau lenitivo chamado... vingança. Na política, passada a régua nessa conta, comprou-se por cem um estresse que talvez não valesse vinte. De outro lado, epidemia de temores é abastecida com dose diária de notícias alarmantes em que recordes são batidos e barreiras ultrapassadas, como se estivéssemos numa olimpíada funesta do obituário internacional.
O povo, que tanto agita os fantasmas mentais de alguns senhores da Suprema Corte, não tem culpa alguma na instabilidade política do país. O povo, o soberano povo, é vítima. É dele o desemprego, o prato magro do pouco alimento, o teto perdido, o lazer impossível, o beco sem saída, a esperança perdida, os longos dias vazios e as ainda maiores noites de insônia. Todos esses apertos passam longe, bem longe dos que exibem a musculatura do respectivo poder enquanto se encaram com aquele olhar gentil com que os boxeadores esquentam hormônios para a luta.
Muitos titulares de poder de Estado talvez se sentissem melhor se o povo se recolhesse em isolamento sanitário horizontal, em isolamento político vertical e num lockdown acústico de onde sequer suas vozes fossem ouvidas. No entanto, as manifestações populares estão salvando a democracia enquanto os poderes se provocam, rixam, e disputam supremacia onde deveria haver independência e harmonia.
Por longos meses, o governo vitorioso nas urnas buscou escorar-se no povo, com o qual Bolsonaro tem conexão incomum. No entanto, à medida que preservava o estilo e os laços com o povão, indispensáveis para manter suas salvaguardas no tabuleiro da política, ele perdia apoiadores naquela parcela da elite que votou nele, mas nunca o acolheu muito bem. Prefeririam, esses, um conservador estilo britânico, tipo Stanley Baldwin, ou seja, um Bolsonaro gentleman, que nunca existiu. Seu apoio perde vigor entre aqueles que, vendo as dificuldades enfrentadas pelo governo esperam dele uma atitude impossível. A atitude possível, perfeitamente possível, é dar o primeiro passo no rumo certo.
Muitas vezes, ao longo dos anos, ouvi dizer que “o Brasil é maior do que a crise”, e tem sido. No entanto, se mais estável, com instituições melhores, seria um país melhor para seus filhos. Este é o país de Bonifácio, de Nabuco, de Caxias, de Pedro II, de Mauá. Não será derrotado num conflito de picuinhas! As urnas falaram alto em 2018 e exigem respeito, principalmente daqueles, tão poderosos e arrogantes, que a ninguém julgam dever respeito. Zele Deus por esta sua nação.
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* Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
MARCO LONGO - 08/06/2020 12:17:08
Já passou da hora de cada um dos poderes parar para pensar qual tem sido a contribuição de cada um para a atual e crescente polarização. Especialmente caberia ao PR passar a deixar sua atenção exclusiva com a evolução do seu prestígio para a próxima eleição e concentrar-se em governar. Em outras palavras deixar de ser deputado a assumir sua atual função.Menelau Santos - 05/06/2020 02:19:21
2020: o ano que nao terminou.Eduardo - 04/06/2020 18:33:59
Esse texto poderia se chamar: "Crônica de um Dia Qualquer no Ano de 2020.". Reflexão fiel do que estamos passando e assistindo por esses dias. Parabéns, Professor.Odinéia Amaral - 04/06/2020 15:56:09
Perfeito o texto!Murilo Melo - 04/06/2020 14:55:11
Como é satisfatório poder acompanhar seu blog com artigos magistralmente escritos, visão aguçada da sociedade e comentários de elevado padrão. Por mais pessoas como você aqui no país. Parabéns, virei fã assíduo!Luiz R. Vilela - 04/06/2020 12:06:56
Como alguém já disse: "Na vida, somos eternos aprendizes". Então vamos vivendo e aprendendo. O que aprendemos agora com o governo Bolsonaro, é que no nosso pais existe uma pré- disposição para que as coisas fiquem como sempre foram, ou seja, os que sempre se valeram do estado para seu progresso econômico, abominam qual quer ideia de mudanças. O Bolsonaro ao surgir com uma visão diferente de administração pública, onde o dinheiro do contribuinte deveria ser gasto só em causas justas e em benefício do próprio povo, desencadeou esta "coalizão" de forças dos inconformados, eternos mamadores das tetas da viúva. Passaram a taxa-lo de nazista, fascistas, Hitler reencarnado ou seja, um déspota sem qualquer esclarecimento. Um "ogro político". A verdade, ao me ver, é cristalina, dificultar ao máximo a intenção do presidente, de tornar o pais em uma nação séria, onde os interesses privados não mais prevaleçam aos interesses públicos. Não é possível ver tendência ditatorial, num presidente que não consegue aprovar qualquer projeto seu no congresso nacional. Mesmos os projetos descaracterizados pelos parlamentares, são depois ainda sancionados pelo presidente, que tem ciência de qualquer veto, será derrubado pelo congresso. Também é de saltar aos olhos, o fato de que não consegue sequer nomear um delegado de carreira para diretor geral da polícia federal, pela tese "futurológica" de um ministro monocrático do STF, que poderá se valer desta nomeação para intervenções políticas no órgão. Mas a observação que mais realça a realidade, é que já não somos mais governados pelo executivo, com a fiscalização do legislativo. O que somos mesmos, é tutelado pelos onze ministros nomeados do STF. Também uma pergunta se faz pertinente, como foi que o lula, tido e havido como extremista e radical, governou os treze anos do PT e ainda saiu do poder com esta legião de admiradores, que hoje infernizam a vida do Bolsonaro? Teria sido pela sua beleza física? Ou teria sido a política de cofres abertos? Talvez um dia saberemos.