• Percival Puggina
  • 27/03/2016
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PÁSCOA NUM MUNDO EM DESORDEM

 

 " O mundo está em absoluta desordem!", nos sentimos impelidos a expressar enquanto sopram os ventos e caem ao nosso redor os raios de uma tempestade de mudanças. No entanto, essa tempestade nunca vai amainar pois nasce de conflitos internos numa civilização em luta contra si mesma. O que seria, então, a ordem?

 O gesto - por exemplo - do hérulo Odoacro, em 4 de setembro de 476, enrolando as insígnias do império romano e as remetendo para Zenão, em Bizâncio, foi o emblema de um caos muito maior e de efeitos muito mais prolongados do que teríamos hoje se, subitamente, deixassem de existir a comunidade européia e os EUA. O cristianismo, ele mesmo, não foi uma tempestade sobre o mundo antigo?

 O desenvolvimento da civilização acelerou drasticamente o processo de mudanças, encurtando tempos e distâncias. “E no entanto se move!”, teria insistido Galileu anunciando que a Terra não era o umbigo do universo. “Preferia ter nascido relojoeiro!”, desabafava Einstein ao perceber que a Teoria da Relatividade (reduzindo a amplitude da física newtoniana) era abusada pelos profetas do relativismo, convencidos de que com o desaparecimento das linhas e ângulos retos também sumiam as noções de verdadeiro e de falso.

Hoje, a “carta a Garcia” é lida on line. Satélites, a milhares de quilômetros de altura, são capazes de esquadrinhar polegadas de solo e metros de subsolo do planeta. Qualquer pessoa ligada por computador à Internet tem acesso a um volume de informações muito superior à que detinha, há dez anos, o mais bem informado chefe de Estado (a CIA sabia tudo sobre a União Soviética menos que ela estava acabando). O ritmo do progresso deslocou-se do compasso que lhe podiam cadenciar as atividades humanas para zumbir à cadência de máquinas cada vez mais velozes. A política - a velha política, a milenar ciência de governar os povos - parece se encaminhar para uma crise de conteúdo com a crise de conteúdo do Estado e do governo.

O último século assistiu o fim de impérios que se estendiam por continentes e sobre cuja totalidade territorial “o sol nunca se punha”. Nas últimas décadas se articularam, desarticularam e rearticularam dezenas de estados nacionais. Hoje se diluem os efeitos das fronteiras entre os países, de tal forma que, dentro delas e por sobre elas, se expande toda uma imensa gama de organizações que constroem unidades e interesses comuns às vezes mais fortes do que os proporcionados pelos estados nacionais. Servem e continuarão servindo para isso os fluxos migratórios, as grandes corporações empresariais, os blocos comerciais. E se valem disso ensandecidos radicalismos político-religiosos. Mas é sobretudo a instantaneidade da informação que contribui para que se desbordem fronteiras.

No rodar das primeiras folhinhas do terceiro milênio da era cristã, a criatura humana, assistida por máquinas fantásticas, pode refletir sobre tudo isso e pode empenhar sua inteligência na solução dos mais intrincados problemas práticos. Mas continua se considerando uma casca de noz, periclitante no mar da vida, sob a tempestade causada por velocíssimas mudanças no mundo que a rodeia e no seus abismos interiores. Neles, ainda sente a mesma necessidade de amar, de construir, de se arraigar e de se relacionar com os outros, consigo mesmo, com a natureza e com Deus, experimentada por seus avós e pelos avós de seus avós. Ainda acorda, a cada manhã, com aquele mesmo e ancestral desejo de encontrar a felicidade e de dar um sentido à sua existência.

O seu mistério, o mistério do homem, continua só tendo resposta “no mistério do Verbo encarnado”. E o seu bem, o seu valor e a sua felicidade só em Jesus Cristo encontram referências seguras e suficientes - aquela “ordem” - sem as quais afunda, como casca de noz, na tempestade das mudanças e no turbilhão de suas voragens. Tudo muda, tudo passa, mas as palavras dEle não passarão, seja no terceiro milênio, seja nos milênios que se seguirão. Por quê? Porque com ele tocamos a eternidade, vivemos o "mistério do Verbo ressuscitado”. Feliz Páscoa, amigos leitores!

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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
 


Gustavo Pereira dos Santos -   28/03/2016 00:13:24

Época de fazermos uma grande reflexão. Feliz Páscoa, Dr. Percival.

ANA CELIA SANTOS MAIA -   27/03/2016 19:46:22

Feliz Páscoa, Professor PERCIVAL PUGGINA! Obrigada pelo belíssimo artigo. E que Deus tenha piedade nós e nos livre do mal!

Sergio Barreto de Sousa -   27/03/2016 19:36:53

Feliz Páscoa, senhor Percival Puggina!

Genaro Faria -   27/03/2016 19:35:53

Magnífica mensagem de Páscoa para a liturgia deste domingo da Ressurreição, professor Puggina. Um bálsamo para estes tempos conturbados que vivemos. Milagrosamente, o sol que julgávamos declinar no ocidente borda com seus fios de prata a fímbria do oriente no renascer de nossa esperança na paz do reencontro da nação consigo mesma. Que tenhamos aprendido com a tempestade a levantar nossa cabeça com dignidade diante das adversidades, erguendo nossos olhos em súplicas Àquele que jamais nos abandona. FELIZ PÁSCOA a todos que participam desta trincheira cristã da democracia.

Ricardo Moriya Soares -   27/03/2016 15:49:34

Feliz Páscoa!

josé paulo Moletta -   27/03/2016 06:02:22

Brilhante escrito. Feliz Páscoa.

Luis Gonzaga -   27/03/2016 02:06:05

Feliz Páscoa, meu caro Puggina! A você e a todos os seus leitores que comungam a esperança de um mundo melhor, mas não um calcado em aspirações materiais e milagreiras, e sim um construído na verdade, na fé, na justiça e no amor. E, claro, guiado pela esperança, esta mesma que reluz com a ressurreição de Jesus Cristo, e ecoa pelos séculos - desde sua promessa nos ancestrais tempos da criação até sua confirmação no início de nossa era. Feliz Páscoa! Que esta seja o anúncio de uma verdadeira passagem, tanto espiritual quanto terrena, para nós e para nossa pátria.