• Percival Puggina
  • 12/11/2022
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Os atos antidemocráticos que eu vi

 

Percival Puggina

         Quando a expressão “atos antidemocráticos” virou feijão com arroz do discurso político “progressista”, abençoado pela mídia amiga, julguei instrutivo a mim mesmo listar atos antidemocráticos sem aspas que venho observando aqui da pequena cápsula de trabalho de onde escrevo. A lista vai assim:

Primeiro – a função contramajoritária

      Em 2019, em meio a um tratamento rigoroso e invasivo, opondo-se às iniciativas do governo recém-empossado, ministros do STF se declararam no exercício de uma função contramajoritária e passaram a agir como se fossem oposição a um governo recém-instalado.

Segundo – atos antidemocráticos e fake news

       A criação de duas figuras de conceituação imprecisa – atos antidemocráticos e fake news – originou inquéritos abertos para permanecer perenemente assim, sigilosos, misteriosos, ameaçadores e a suscitar medidas coercitivas imediatas.

Terceiro – coerção sobre os ambientes digitais

       A censura nua e crua de veículos que atuam em meio digital, o bloqueio de redes sociais e a desmonetização de canais estabeleceram um ambiente de temor (que levou à autocensura), restringindo a expressão do pensamento em prejuízo da democracia.  E ela não subsiste à perda da liberdade de expressão.

Quarto – desprezo ao povo

        Ao longo de quatro anos, milhões de cidadãos saíram às ruas em dezenas de periódicas manifestações cívicas, clamando por manutenção da Lava Jato, contra a anulação da pena de Lula, pela possibilidade de prisão de criminosos após condenação em segunda instância, fim das permanentes intromissões e invasões de competência do Executivo e do Legislativo pelo Judiciário (STF). A surdez das instituições à voz das multidões não é conduta própria das democracias. Ao menos não dos parlamentos.

Quinto - A prisão do deputado Daniel Silveira

       A prisão do deputado Daniel Silveira, no inovador “flagrante” proporcionado por um vídeo no YouTube, teria sido marca solitária não fosse duplicada pelo covarde consentimento posterior de seus pares.

Sexto – a pandemia

     Durante a pandemia, severíssimas restrições ao direito ao trabalho e à circulação de pessoas infringiram liberdades fundamentais e prepararam o ambiente social para outras demasias que estavam por vir.

Sétimo – desrespeito a prerrogativas do governo

     Mais de uma centena de vezes o STF foi usado por partidos oposicionistas para sustar atos do governo promovendo permanentes intromissões em questões próprias do Executivo, quando não da mera administração pública, criando instabilidade e insegurança jurídica – ambiente em que a democracia não floresce.

Oitavo – o passado do candidato sumiu

       A campanha eleitoral agravou a desordem institucional do país e ampliou em muito os motivos para que o próprio tribunal, que deveria agir em favor do esclarecimento dos eleitores, entrasse em rota de colisão com seus fins. O candidato da oposição, não por acaso aquele que nomeou a ampla maioria de seus membros, foi submetido pelo TSE a um photoshop eleitoral, sendo apagados seus antecedentes, lançado sigilo sobre os acontecimentos de seu governo, rompidas suas relações internas e externas. Enquanto Lula era beneficiado com essas graças, os pleitos de Bolsonaro eram recebidos pelo “xerife” Alexandre de Moraes com caneta fumegante e promessas de novas desgraças. Não, a eleição não transcorreu num ambiente isonômico, isento e equilibrado. Foram atos muito graves contra condições inerentes à democracia.

Nono – censura a prazo

       Às vésperas da eleição, aceleraram-se os meios de censura, chegando à sua absurda aplicação na forma especialmente grosseira de censura prévia, notabilizada com o famoso consentimento viva voz proporcionado pela ministra Cármen Lúcia.

Décimo – parlamentares sem redes sociais

        Depois da eleição, a democracia foi duramente atingida por determinações judiciais que bloquearam as redes sociais de parlamentares. A agressão que esses atos cometem contra a democracia é ainda mais explicitamente inconstitucional. Hoje, deixar um parlamentar sem acesso a seus seguidores é tirar-lhe a palavra, fundamento da própria expressão “parlamentar”. Contudo, assim tem sido feito.

Conclusão

       Os dedos que ameaçam a população deveriam voltar-se para o próprio peito, examinar a própria consciência, penitenciar-se por seus excessos, entender a voz das ruas e prover uma saída institucional para a crise que não foi o povo quem provocou.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

 


RIVADAVIA ROSA -   16/11/2022 15:18:30

Magistral e bem descrito sob o prisma da novilíngua [newspeak orwelliano] que é uma patologia linguística [perversão da linguagem pelo socialismo] que insidiosa e criminosamente promoveu a falsificação da legalidade democrática e a abolição do Estado de Direito, devidamente certificado por GEORGE ORWELL [Eric Arthur Blair], escritor, jornalista, ensaísta, britânico A linguagem política, destina-se a fazer com que a mentira soe como verdade e o crime se torne respeitável, bem como a imprimir ao vento uma aparência de solidez

Paulo Eduardo Gomes Alves -   16/11/2022 08:12:05

Coerência é a tua constante

NEY DARIO KAMINSKI -   15/11/2022 23:32:28

SEM DÚVIDA, PUGGGINA RELATOU COM BRILHANTISMO TODAS AS VERDADEIRAS MANIFESTAÇÕES ANTI DEMOCRÁTICAS, PRINCIPALMENTE PELO ALEXANDRE, MAS APOIADAS PELOS DEMAIS ministros.

Décio Antônio Damin -   15/11/2022 11:31:32

São razões fortes e plausíveis...O telhado tem, furos...! O candidato derrotado também tem pontos criticáveis. A luta deveria ter antecedido as eleições, mas, agora, terminado o processo eleitoral e havido a escolha de um dos candidatos pela maioria dos eleitores, a Democracia requer respeito ao resultado, apesar de tudo o que possa ser alegado...!

CarlosD -   15/11/2022 01:10:05

Você é bom, cara. Grande percepção da realidade, senso de justiça, amor à Pátria Amada e ótima dissertação. Sinceras Congratulações !

julio c. costa da silva -   14/11/2022 20:08:10

parabéns, mais uma vez brilhante opinião

MARIA THOMPSON ALVAREZ DE CARVALHO -   14/11/2022 13:03:00

Perfeitíssimo, professor! Merece, esse artigo, toda a atenção das FFAA. Estão aí elencados os motivos de sobra para se parar esse descalabro!

EDISON BECKER FILHO -   14/11/2022 11:21:28

Você sugere diálogo com quem não tem o menor interesse em ouvir. Estão aí para impor e assim farão se não forem colocados em seus lugares. Não existe civilidade! Se esperarmos não teremos noção do quão caro isto será!

Ajacio Brandão -   14/11/2022 09:53:19

Como sempre, conciso e sem panos quentes.

ALCIDES POLIDORO PERSIGO -   14/11/2022 08:47:50

SERÁ LAMENTAVEL SERMOS GOVERNADO POR ALGUÈM QUE APOIA OS GOVERNOS SOCIALISTAS. QUE NOS ESPERA?

JOAO EICHBAUM -   14/11/2022 07:49:50

Parabéns Puggina. Até parece que combinamos. O final da minha crônica dessa semana diz: "Alardeia-se que vivemos numa democracia. Mas não há democracia sem povo. Só nas teocracias, os "poderes constitucionais" estão nas mãos dos deuses".

TADEU REINALDO SCHERER -   13/11/2022 19:54:47

Excelente!!

Menelau Santos -   13/11/2022 19:33:24

Resumo perfeito Professor. O problema da atual composição do STF é moral. O problema do nosso congresso é de omissão. O problema da nossa grande mídia é conivência.

Milton Vicente Demasi -   12/11/2022 22:12:18

Sempre perfeito.

Manoel Luiz Candemil -   12/11/2022 16:37:35

Se for confirmada a posse do candidato declarado "vencedor" pelo TSE para presidente da República, permanecerá sendo exigida improbidade administrativa dos servidores públicos da União, dos Estados e dos municípios?