Entre 1980 e 2002, o Partido dos Trabalhadores foi uma ininterrupta saraivada de pedras contra as vidraças do poder. Pedra dura sem ternura, nem meias palavras. O partido adotou a denúncia como elemento central de suas estratégias, dividindo-se entre as tribunas dos parlamentos e os balcões do Ministério Público e do Poder Judiciário. Era carga cerrada, que ganhava eficiência e eficácia com produção de cartilhas e com a rápida propagação das mensagens e orientações até o mais solitário vereador ou militante, no mais remoto dos municípios. Onde houvesse um meio de comunicação e alguém para ser municiado, ali chegava a informação ou a versão mais conveniente para o ataque, em dimensões nacionais, aos adversários da hora. Foram mais de duas década disso.
Os alvos não eram apenas os ocupantes do Palácio do Planalto. Eram, também, as vidraças de todo espaço de poder cobiçado pelo partido. E o partido cobiçava todos os espaços de poder. A articulação com movimentos sociais e sindicatos permitia-lhe dar um jeito de mobilização popular às manifestações estrategicamente promovidas contra seus adversários em todo o país. Como era de se esperar, o partido tornou-se o queridinho da mídia porque, na área política, ninguém conseguia ser mais ativo. O PT não era apenas fonte. Era protagonista e fonte torrencial de informações maliciosas, que geravam repercussão.
Eram cotidianos, nos parlamentos, os discursos de senadores, deputados e vereadores petistas brandindo como tacapes, jornais e revistas que reproduziam suas denúncias e acusações. Não passava pela cabeça do PT a ideia de que o jornalismo, em especial o jornalismo investigativo, pudesse se tornar um incômodo. Não! Era uma parceria que dava bons resultados. O PT atacava e a imprensa multiplicava os efeitos do ataque. A imprensa investigava e o partido repercutia. Os órgãos oficiais investigavam e vazavam para o partido e para a imprensa. E a vida sorria para todos.
No entanto, poucos meses após haver o PT chegado ao poder, os mesmos veículos que antes eram fidedignos e parceiros passaram a ser vistos como manipuladores e inimigos. Acumulam-se, desde então, as tentativas de lançar controle sobre os meios de comunicação. Mais recentemente, tal proposta recebeu o nome de "marco regulatório" da mídia. Agora, foi a vez da presidente Dilma, numa de suas cotidianas crises de nonsense, proclamar, referindo-se às denúncias sobre a Petrobras: "Não é papel da imprensa investigar!". Segundo ela, a tarefa pertence à Polícia Federal.
A frase atropela rudimentares liberdades propiciadas pela democracia, essenciais à subsistência desse regime. Tem potencial para destruir as pontes sobre as quais o partido de quem a proferiu palmilhou os caminhos do poder. E ergue nuvens negras sobre o futuro do país em suas mãos.
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* Percival Puggina (69), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
Felipe Cardoso - 24/09/2014 20:15:22
Caro Percival...excelente análise da atual conjuntura praticada pelo partido. Tal qual crianças acuadas apontando seus dedos aos quatro ventos, tentando se eximir das culpas pelas travessuras que acabaram mal, assim vemos hoje a cúpula do partido - vultos da política brasileira - se contorcendo na lama de sua tão assim chamada "ideologia". Infelizmente creio que nas urnas este ano, amargaremos mais quatro anos do que aí está. De qualquer forma o papel da imprensa, seja ela tendenciosa ou imparcial (sim, precisamos das duas), continua sendo de vital importância, pois só assim conseguimos construir um panorama e formar uma opinião.Odilon Rocha - 22/09/2014 15:32:56
Prezado Percival É isso aí! Infelizmente. É como na história do gaudério, guasca barbaridade!, que quando viu, pela primeira vez, um trenzinho elétrico em uma loja de brinquedos da cidade, assustou-se, sacou a arma e crivou de bala o "bichinho". O dono da loja, aos berros: " O senhor está louco?" Ao que o gaudério respondeu: "Louco que nada, tchê! Esse bicho depois que cresce faz muito estrago. Lá pra fora, na linha, já matou umas vaca e um amigo meu"! Imagina a cara do dono e de quem estava em volta. No Brasil atual, nem esse conto pilhérico tem vez. Nossa malha ferroviária está subutilizada e em frangalhos. Mas o 'PTrem', planejado, construído e, pricipalmente, apoiado, ao longo de anos, corre por aí! Se vai atropelar rudimentos ou destruir pontes, não sei. É melhor tomar cuidado!