Percival Puggina
Confundir estado laico com estado ateu é como confundir estado sólido com estado gasoso.
Diz-se laico do estado não religioso. Ateu é o estado totalitário que se faz objeto de culto. Surpreso com saber? Mais ainda ficará quando perceber que há quem queira precisamente essa anomalia para si e para todos nós.
Fiquei pensando nisso ao perceber a estarrecida surpresa de muitos jornalistas brasileiros, primeiro com a indicação e, logo após, com a aprovação de André Mendonça para a vaga existente no STF. Diversos senadores manifestaram-se, também, a respeito da tal suposta incompatibilidade. Não duvido que muitos dos votos contrários tenham sido motivados por ela. Sim, sim, no Senado há gente para todos os desgostos.
“Na vida e em casa, a Bíblia; no STF, a Constituição”. A frase do ministro só não esclareceu quem, diante da luz da verdade, imediatamente coloca óculos escuros. Fotofobia da razão e da alma. O Brasil estaria bem mais feliz se os dez colegas do novo ministro tivessem a Constituição como Bíblia de suas decisões e não a transformassem no Livro de uma seita muito particular, a serviço de suas próprias opiniões e irmandades.
Bem entendido isso, torna-se oportuno sublinhar que é discriminação e preconceito não admitir opinião ou argumento originário de algum ditame religioso, ou a ele semelhante.
Afirmar em tais ocasiões que “o estado é laico”, como quem passa a tranca na porta e encerra o assunto, é retórica farsante. É usar a palavra para bater a carteira do auditório.
Sabem por quê? Porque a única consequência da aceitação dessa trampolinagem é cassar a palavra da divergência sob uma alegação falsa. Não há o menor sentido em que opiniões com fundamento moral desconhecido ou inexistente, diferentes tradições, chavões jornalísticos, contraditórias referências científicas e até o mero querer de alguém ou de alguns sejam legitimados, mas se declare inadmissível algo inerente ou assemelhado ao saber cristão, amplamente majoritário na sociedade.
Com muita ênfase, os constituintes promulgaram a Constituição “sob a proteção de Deus”. Determinaram ser "inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livro exercício dos cultos" (art. 5, inc. VI). Afirmaram que "ninguém será privado de direitos por motivo de crença" (art. 5, inc. VIII).
Não, não são as opiniões de indivíduos ou, mesmo, de figuras públicas em que se perceba inspiração religiosa que violam a Constituição, mas as tentativas de os silenciar. Foi exatamente contra essa pretensão totalitária que os constituintes ergueram sólidas barreiras constitucionais.
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
Paulo Antônio Tïetê da Silva - 14/12/2021 18:21:45
Essa frase, não foi dita ANTES da indicalção do minitro enterior a este? Teho certeza que se ela fosse "...terrivelmente umbandista" e um Pai de Santo tivesse sido indicado, esses que agora criticam, estariam de pé aplaudindo o indicação.Décio Antônio Damin - 13/12/2021 11:00:48
"...sob a proteção de Deus"....não quis dizer que a concepção criacionista fosse aceita pela nossa constituição! "Ele" é uma figura desenhada para satisfazer as nossas necessidades de uma explicação da origem e um conforto para a nossa finitude. Agora, ser Ministro do STF por ser "terrivelmente evangélico" fere todos os princípios que afirmam a liberdade religiosa e de crença. Deveriam essas referências ser deixadas de lado, e que todos nós partíssemos em busca de uma justiça isenta de preferências religiosas. As afirmações de direcionamento religioso nesta indicação do Presidente da República foram, para mim, "terrivelmente inoportunas"!Célia pereira barbosa - 11/12/2021 07:33:12
EXCELENTE!!! PENSO QUE, COM A CHEGADA DO DR. ANDRÉ MENDONÇA, O STF TENHA GRNDE MELHORA E COMEÇEM A SER MINISTROS DE VERDADE.José Rui Sandim Benites - 10/12/2021 11:20:59
Como sempre, o professor Puggina, argumenta tendo como pano de fundo a Constituição, a lei maior, o contrato que todos deveriam respeitar. Mas, estes chavões: "estado laico", temos que respeitar "a ciência", temos que preservar a "democracia", os "neofacistas", etc. Assim, querem fazer terminar a discussão sobre estes temas. Pronto dito o chavão, calem-se. Não vão nos calar. O Estado é um ente abstrato. As leis e regulamentos tem que ser seguidos por alguém. Este alguém é a Nação de pessoas que devem se submeter a lei e regulamentos. E, que financiam o Estado, pagando os tributos compulsórios. E estas pessoas tem crenças, que a lei maior protege, os artigos da Constituição, bem pinçados pelo professor Puggina. A Ciência, muitos não sabem o que falam. Não conhecem os conceitos de exatas e não exatas. A ciências biológicas e médicas, não são exatas, cada indivíduo tem um DNA diferente. Até uma mudança das bases nitrogenadas (Timina, Uracila, Adenina e Citosina) irão formar uma proteína diferente. E, formação genética e forma de vida determinam a imunidade. Por isto, tanta discussão pelos "especialistas". Em relação uma doença nova (Covid-19). Na minha humilde opinião, quem deve receitar os tratamentos são os médicos. Simples assim. Então, tudo que é para vida: as vacinas, fármacos até benzedura tem que ser considerada. O psicológico da pessoa também conta. Falam em democracia, mas querem criminalizar a opinião, fazer quem tem opinião contrária, calarem-se. Os neofacista são os que defendem a propriedade, a família, a liberdade e confessa uma religião. E, as questões sanitárias, primeiro era para criar empecilho para exportações de produtos. Agora criam empecilho para o tráfico de pessoas. Estas regras sanitárias, terminaram com a circulação de equinos. Agora só vê nas cidades homens, carregando carroças, no lugar dos equinos. E, esta gente que tudo tem razão. E, os outros são considerados como dito os chavões: fundamentalistas religiosos, antidemocráticos, negam as ciências, neofacistas, preconceituosos e intolerantes. E, quem nunca trabalhou, quem não estudou, que a sua vida foi só sindicalista. E foi chefe do executivo federal por 8(oito) anos e que teve várias acusações de corrupção, E condenado em todas as instâncias (1º,2º e STJ)e absolvido em defesa processual no STF, e não no mérito. E que se diz o homem mais honesto e pai dos pobres, E, que só vive com os ricos. Viajando pela Europa de jatinho, comendo do bom e do melhor (redundância para mostrar a vida de marajá). Uma das premissas da democracia é alternância do poder. Mas, a grande mídia quer eleger este cidadão, que quer se perpetuar no poder, como maior protagonista. Que paradigma podemos ter deste cidadão para exemplo dos nossos filhos e netos. Nenhum. Não dando espaço, nem para os seus partidários. Não tem fundamento. Mas continuamos na resistência.Fernando Braga - 10/12/2021 00:42:53
Como sempre, brilhantePAULO DOS SANTOS - 09/12/2021 20:11:27
Que venha o DiluvioPaulo Roberto Wenning - 09/12/2021 17:00:35
Satisfação em ler as suas colunas e resenhas sempre muito pontuais, esclarecedoras e elucidativas, senhor Persival. Grato por mais esta oportunidade sobre este momento atual do nosso querido e sofrido Brasil.Ilson - 08/12/2021 16:25:14
O Estado é o cidadão constituído. Premissa primeira. Todo cidadão, é medianamente imbuído de algum sentimento religioso ou fé. Segunda premissa. Estabelecidas premissas maior e menor, chegamos a conclusão de que para termos um Estado totalmente livre do sentimento religioso, é preciso importarmos cidadãos de Marte. De outra forma, não há como haver Estado absolutamente descontaminado de sentimento religioso, a não ser, pela mais pura violência. A esta conclusão, dezenas de chefe de Estado comunistas chegaram e aplicaram essa logica durante mais de um século. O resultado foi fome, miséria e morte, muita morte.Assis Moraes - 08/12/2021 16:03:48
Muito esclarecedora está esplanação do PercivalNelson Rodriguez Mouriz - 08/12/2021 15:10:11
É isso caríssimo Puggina. Estão tentando quebrar a espinha dorsal da dignidade e liberdade cristãs que,paradoxalmente os libertou e permitiu a opinião,e o livre arbítrio em sociedade ... Um fraterno abraço .Menelau Santos - 08/12/2021 15:00:14
Quisera os ministros do STF seguissem a Constituição em vez da Bíblia. Não seguem nenhum dos dois. Seguem apenas suas cabeças cheias de impulsos totalitários