O CASO SABOIA
Há uma regra de ouro para compreensão do que acontece no governo brasileiro: Dilma nunca, jamais, fica furiosa pelos motivos certos. Quando ela explode e sai atropelando o que haja pela frente, é porque alguém fez o que devia e não o que ela tinha determinado ou suposto que fosse feito.
No caso do encarregado de negócios do Brasil na Bolívia, Eduardo Saboia, aconteceu exatamente isso. Dilma foi surpreendida pela manifestação de uma raridade. Enfureceu-se diante de algo que dificilmente encontra à sua volta: um homem de caráter, um espírito nobre, para quem os princípios morais situam-se muito acima dos berratórios - da gritaria autoritária e mal educada que alguns despreparados confundem com expressão do próprio poder. Eduardo Saboia fez o que tinha que fazer. A frase com que explicou sua posição, citando o evangelho de São Mateus, soa como uma bofetada nas bochechas dos nossos mandatários: Eu escolhi a porta estreita e lutei o bom combate. Eu não me omiti. Eu optei pela vida e salvei a honra de meu país, que defendo sempre.
Tudo que hoje se sabe a respeito do faz de conta jogado entre Brasília e La Paz fez soar nos meus ouvidos aquela belíssima canção com letra de Paul Anka, universalmente conhecida na interpretação de Frank Sinatra. Refiro-me a My Way. Há um momento, nessa canção, em que o tom se eleva, e no qual as palavras parecem gritar ao Brasil de hoje o que seja um homem senhor de si mesmo, que diz e age segundo o que em verdade sente. Reproduzo esse trecho como homenagem ao diplomata Eduardo Saboia, levado às barras de uma sindicância por gente muito, muito menor do que ele:
For what is a man, what has he got?
If not himself, than he has naugth.
To say the things he truly feels,
And not the words of one who kneels.
The record shows, I took the blows.
And did it my way!
Desçamos, agora, infinitos degraus. E falemos novamente de Dilma, que durante um ano e meio fez de boba a representação brasileira em La Paz, transformando o asilo do senador em prisão domiciliar. Suponhamos, leitor, que Evo Morales fosse um tiranete de direita e que o senador Roger Pinto fosse um metalúrgico esquerdista, líder da oposição. Qual seria a atitude de Dilma nesse hipotético episódio? Agiria do mesmo modo que agiu (quase incorrendo em delito de cárcere privado)? Claro que não!
Pois é nessas mãos que estamos. É para esse brejo que levamos a Nação, entregando não só o governo, mas o Estado brasileiro, a um grupo que faz política externa desse jeito, que quer mandar no Paraguai e obedece à Bolívia, que convive com bandidos e ameaça com punição gente como o diplomata Eduardo Saboia.
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* Percival Puggina (68) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, membro do grupo Pensar+.