• Percival Puggina
  • 27/09/2018
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LIÇÕES DA ELEIÇÃO AOS POLÍTICOS E SEUS PARTIDOS

 

 Verdadeiras ou não, frequentemente suspeitíssimas, as pesquisas seguem balizando a cena eleitoral. A análise que farei aqui pressupõe que elas não devam ser lidas de cabeça para baixo, ou seja, imagino que acertem ao menos quando apontam para a existência de um bloco dianteiro crescendo, um bloco intermediário dessorando e uma turma do rodapé variando entre o pouco significativo e o insignificante.

No grupo intermediário se situa o candidato Geraldo Alckmin, com o expressivo apoio de uma legião de partidos cujas bancadas de deputados federais arregimentam mais da metade da Câmara dos Deputados. Mais da metade! Mesmo assim, as manifestações de desânimo de alguns líderes tucanos e a falta de eco aos apelos de um patético Fernando Henrique, evidenciam que a carta desse centrão saiu do baralho.

A explicação do fenômeno é identificável a olho nu. O quadro partidário nacional se converteu num aglomerado quase indiscernível de siglas partidárias cujos programas ninguém conhece e cujas condutas, salvo alguma excepcionalidade, nada revelam sobre si mesmas. Mais grave ainda: detentores de mandato legislativo, que são a parte mais numerosa e representativa da elite partidária, como regra, resumem sua atividade dita “política” em zelar pela própria reeleição e em atender demandas de interesse pessoal, coletivo ou regional. Uns tantos, ainda, ocupam-se com proteger a retaguarda e apagar suas digitais onde as mãos tenham andado. Isso é o bastante para uma atividade política com expressão em pleito nacional? São essas as lideranças que têm a apresentar à nação?

Quando observamos os dois dianteiros da eleição presidencial, o que se torna nítido é o trabalho de convencimento. O PT sempre fez o seu. Ele é enganoso, despido de qualquer relação com a realidade e com a verdade. O partido constrói versão para tudo que o compromete e é perito em jogar sobre os demais as culpas e as consequências de seus piores atos. Lideranças e militantes fazem política full time e repetem incessantemente, por todos os cotovelos, aquilo que lhes interessa.

Nos últimos dois anos, Bolsonaro foi um solitário e operoso comunicador de suas convicções. Faltaram-lhe orientação técnica e cuidados de forma e conteúdo, mas não lhe faltaram entusiasmo nem identificação com importantes anseios nacionais. A sociedade quer proteger a infância e a instituição familiar; quer que professores ensinem e estudantes estudem; quer que a criminalidade, a violência e a corrupção sejam combatidas; quer a Lava Jato preservada, polícias valorizadas, bandidos presos e penas cumpridas. Candidato do minúsculo PSL, sem dinheiro nem tempo de TV, arregimentou multidões e lidera a disputa sucessória a despeito da carga cerrada que lhe fazem a Globo, a Folha, o Estadão e a maior parte do mundo cultural e estatal sob influência petista.

Nada é mais insosso do que um projeto de poder pelo poder. O país seria bem menos sujeito a grandes instabilidades se os partidos esgrimissem ideias, se operassem no sentido de formar opinião e criar bons consensos. Se eles não servem para o diálogo com a nação sobre seus problemas, se não recrutam lideranças qualificadas, se seus líderes marcam o próprio território e cuidam de si mesmos, se não se importam com as pautas das ruas, se não resistem à propagação das teses mais absurdas, se não as confrontam com outras superiores, tornam-se entes inservíveis e desprezáveis.

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.

 


Joel J. Cândido -   01/10/2018 15:03:26

Caro Puggina: Este artigo foi o melhor que li, nesta eleição, sobre as pesquisas. Parabéns! Mas não é só por ele que figuras como um dos mais notáveis e lúcidos pensadores do Brasil. Sigamos em frente. Abraço forte.

vilnar leal -   28/09/2018 16:36:47

Parabens pelo comentário. Bolsonaro neles.

adilson -   28/09/2018 16:05:08

Cada qual se move de acordo com suas nescessidades.E uma das facetas nacionais é a nescesidade de tutela.Sempre foi e possivelmente continuará.Então fica um falso dilema que engana quem não liga causa e consequência.Como disse um comentarista anterior.Se voce estava empregado até 2010,associa com lula.Automaticamente ,se perdeu o emprego foi culpa de outro.Não passa pela cabeça dela que uma coisa ruim possa ser atribuida à quem anteriomente uma coisa boa foi creditada.E tanto uma coisa ,quanto outro tiveram a mesma raiz,o petismo ou lulismo como queiram.Aconteceu com o varguismo,com malufismo e agora com o lulismo.Todos os ismos que geralmente terminam mal,só que agora querem nos levar ao pior de todos eles,ao mortal paraiso sobre a terra,apelidado de socialismo ,por que comunismo é palavrão.

Rossini -   28/09/2018 04:39:00

O politicamente-correto parece-me uma espécie de moral farisaica, sendo assimilado na mesma medida em que as pessoas vão se imbecilizando com a moda em voga. Há uma crise de burrice, e a certeza dos ignorantes é inabalável. Como discutir idéias nesse estado de coisas se nem o óbvio é compreendido? A inteligência dos medíocres é seu censo crítico; critica-se o que se ignora e que se quer há a pretensão de conhecer. A plêiade de analistas multiplica-se. Todos sabem o problema e todos tem a solução, no fundo a mesma: manter tudo como está. Sou jovem, enoja-me o pedantismo da minha geração. Não vêm valor nos cabelos brancos, nas palavras modeladas pela experiência. Obrigado por sua sinceridade e clareza Sr. Puggina!

Carlos Edison Domingues -   28/09/2018 01:27:47

PUGGINA ! No último período deste artigo "...políticos e seus partidos ." disseste tudo a respeito da nossa triste realidade. Eu só inverteria o pensamento para "partidos e seus políticos". Quando tínhamos apenas a ARENA e o M.D.B. o Poder Judiciário assistia as Convenções. Naquela época a oposição esbravejava contra o que chamava de "engessamento" da vontade popular. Abriram -se as porteiras e passamos a ter mais de 30 legendas. Cada uma delas subvencionada com dinheiro público. Alguns donos de legenda decretando intervenções em diretórios e, simultaneamente, denunciados por variados delitos na Justiça Federal. Qual o honesto, responsável pela família e pelo exercício da profissão tem o desprendimento de colocar o nome numa legenda partidária e disputar um pleito, onde a campanha já é manipulada pelo Diretório Nacional. As pesquisas, ainda que de credibilidade incerta, demonstram o fracasso de quase a totalidade dos grandes partidos . Carlos Edison Domingues

Lúcio Mauro -   27/09/2018 19:09:50

Interessante o ponto de vista de Bolsonaro surgir como "operoso e solitário comunicador de suas convicções" (...) "sem técnicas e formas de conteúdo". Entretanto, essa bruta forma de se exprimir não foi o que realmente o fez surgir do deserto das apelações publicitárias identificando-se como um arauto de uma parte da sociedade exausta da repetição política? Ou seja, será que se Bolsonaro surgisse sem essa veemência tresloucada em seu discurso conseguiria fazer parede para o Lulismo populista?