• Percival Puggina
  • 03/12/2020
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GUIAS CEGOS!

 

“Guias cegos, que coais o mosquito e tragais o camelo”. (Mt 23, 24)


Em pleno século XXI, os moradores de Criciúma, em Santa Catarina, experimentaram a derrubada dos muros e a invasão dos bárbaros. Nada sei sobre estes novos vândalos que habitam um submundo ao qual não tenho acesso, mas sei quem não pode ser inocentado quanto ao fato. Esse é um contingente muito mais numeroso e visível.

 Não posso isentar de responsabilidade os autores do discurso segundo o qual “no Brasil se prende demais”. Ora, no primeiro semestre deste ano, criminosos que circulam em nossas ruas com a liberdade dos pássaros cometeram 25,7 mil homicídios. Acresça-se que, segundo o CNJ, apenas algo entre 5 e 8% dos homicídios são investigados! Nessas mesmas ruas, também circulam traficantes, estupradores, ladrões e assaltantes a infernizar o dia a dia do brasileiro. E mesmo assim, temos presos em excesso? Precisamos de políticas de desencarceramento? Progressão automática de regime? Vítimas abandonadas e vantagens para os criminosos, à nossa custa?

 Não isento os muitos magistrados mais preocupados com sua visão sócio-política da criminalidade (não por acaso equivocada, porque ideologizada) que considera o crime contra o patrimônio como uma forma de ato político, de ajuste de contas sociológico, espécie de proclama revolucionário contra o direito de propriedade. Então, quando impossível não contornar o determinado pelo Código Penal, mandam o réu para o “sempre-aberto”, assim chamado por que está aberto, sempre, para as mesmas ruas de onde operavam antes da pantomima judiciária.

 Como não ver a culpa dos ministros do STF? Quando o térreo do edifício judiciário prende por motivos graves, na luxuosa cobertura ministros soltam por motivos fúteis, no exercício de uma benignidade não virtuosa, filha da insensibilidade típica de quem vive entre canapés e lagostas ao thermidor. Ao mesmo tempo, sensíveis como flores de gardênia, tomam-se de ira punitiva se algo ou alguém os desagrada pessoalmente...

 Como inocentar nossos congressistas que deliberam sobre leis penais e processuais com o descarado intuito de favorecer os réus, situação de muitos deles, em detrimento da sociedade e em desrespeito às vítimas? Ampliaram o novelo das garantias e recursos, algemaram os agentes da persecução criminal e dos magistrados com uma lei sobre abuso de autoridade que inibe (poderia dizer coíbe) sua atividade. Tiveram o desplante de criar um “civilizatório” juiz de garantias enquanto se torna crescentemente ferina a vida nas calçadas, nas ruas, nas estradas e na Criciúma ou na Cametá de cada dia.

 Como perdoar os ministros do STF que votaram pelo retorno à interpretação de que a pena só pode ser cumprida após trânsito em julgado, por esgotamento de todas as instâncias recursais? Restauraram a impunidade, o império da chicana, a aposentadoria vitalícia das denúncias.

 Como não ver, ao mesmo tempo, que aumenta o rigor contra crimes que por motivos políticos têm especial rejeição da esquerda? Como não ver esses “guias cegos que coam mosquitos e engolem camelos"?

 

* Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.

 


Francisco Moura -   08/12/2020 21:34:57

Como sempre, um excelente artigo, escrito com maestria peculiar dos grandes escritores. Só uma ressalva, acho que não é lido por quem deveria o ler, os responsáveis por esse estado de coisas, pois vivem numa bolha, incensados pelos áulicos, que tampam seus olhos e ouvidos para realidade brasileira.

Milcy Japiassu -   06/12/2020 09:27:27

Nossa!! Meu muito obrigada Puggina pela clarividência do pensamento! Acabei de conhecer e já sou admiradora. Milcy.

Carlos Edison Fernandes Domingues -   05/12/2020 12:17:31

PUGGINA ! Tu não escreves; tu desfraldas uma bandeira. Carlos Edison Domingues

José Paulo Moletta -   03/12/2020 19:09:58

Excelente escrito, como cde praxe, vou difundir.

Maria Helena -   03/12/2020 18:54:38

Então, muito triste com as verdades apresentadas. Meu consolo único é saber que vozes sábias se levantam . Na minha simplicidade e insignificância sinto-me representada. Obrigada ????

Beth -   03/12/2020 16:37:20

Não tenho mais tempo para os cegos e surdos. São incansáveis . Fome de poder.

IVA Bauer -   03/12/2020 16:26:57

Precisamos urgentemente, de muitos pugginas, nas nossas escolas!!!

Elvio Rabenschlag -   03/12/2020 13:44:10

Parabéns pelo artigo. Não entendo como pessoas que se dizem "de bem" defendem essas ideias da esquerda. São todas as gerações futuras que irão sofrer, inclusive seus parentes. Todos sabemos como são os regimes de esquerda, mas infelizmente tem pessoas que não acreditam. O tempo dirá!