• Percival Puggina
  • 18/12/2023
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A liberdade pede socorro!

 

Percival Puggina      

        Ela grita no tom coloquial do transeunte que me aborda na rua e grita no silêncio quando seu padecer não é assunto à mesa das famílias. E note-se, eu não sou um desenfreado que pretenda liberdade sem limites. Os cabelos que me restam, brancos e poucos, me ensinaram que é bobagem querer ser “livre como os pássaros” porque eles têm necessidades mais pungentes do que as nossas.

Livre é quem faz o que quer”, afirma um senso comum pouco esclarecido, ao qual Shoppenhauer propõe a seguinte pergunta: “Posso querer o que  quero?” Fica bem claro para a maioria das pessoas que não é possível querer a mulher do próximo ou o dinheiro da agência bancária, ou o automóvel alheio, ou suspender a projeção do filme enquanto se vai ao banheiro do cinema, por atraentes ou convenientes que tais interesse pareçam.

Lord Acton (John Dalberg-Acton, historiador britânico do século XIX) afirma algo surpreendente para quem não conhece as raízes da civilização ocidental: “Nenhuma nação pode ser livre sem religião. A religião cria e fortalece a noção do dever. Se os homens não são corretos pelo dever, devem sê-lo pelo temor. Quanto mais controlados estejam pelo temor, menos livres serão. Quanto maior seja a força do dever, maior será a liberdade.” É dele a conhecida frase segundo a qual “todo poder tende a corromper e o poder absoluto corrompe absolutamente; de modo que os grandes homens são, quase sempre, homens maus”.

É o que constato:

Poder excessivo costuma ter a maldade como sócia majoritária.

Essas e muitas outras reflexões apontam para a liberdade como um bem precioso. Ao mesmo tempo, sinalizam algo bastante obvio, ou seja, esse bem, como tantos outros, é frágil e corruptível. Por isso, devemos querer a liberdade sob uma ordem inspirada na lei natural, como condição indispensável para sua sobrevivência.  Uma ordem que nos permita ir e vir sem temor, ordem que nos permita expressar nossa opinião sem cerceamento e com responsabilidade, ordem que nos proporcione segurança jurídica.

O binômio liberdade e responsabilidade é tão natural quanto o que une qualquer ação humana à sua consequência. Inibir a liberdade do ser humano em vista da ordem, significa tirar-lhe a responsabilidade. E quando isso acontece no campo da política através da Justiça temos uma tripla violação: a da liberdade, a da responsabilidade e a constitucional. Sim, há também uma violação à representação exercida pelo parlamento.

A obediência dos cidadãos a uma lei aprovada pelo parlamento é uma forma de auto-obediência e sua legitimidade independe das virtudes ou vícios dos representantes que a sociedade tenha elegido. Em contrapartida, a imposição de uma “lei” (surja ela com o nome de resolução, regulamento ou regimento, fora do legislativo) é tirania, independentemente das virtudes ou vícios de quem as imponha. A liberdade, no Brasil, pede socorro!

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 


Pedro Paulo Chevrand -   20/12/2023 03:23:19

Parabéns, Puggina. Excelente texto, cirurgicamente preciso e totalmente adequado a essa triste realidade que nos foi imposta pelos tiranos de plantão. Tenho fé de que não vencerão e não irão nos transformar numa triste Venezuela. Abraço.

felipe luiz ribeiro daiello -   19/12/2023 19:13:02

Sempre há esperança de dias melhores. Dar primeiro passo muda o Mundo.

Danubio Edon Franco -   19/12/2023 17:16:02

Nunca a liberdade esteve tão ameaçada. Estou plenamente de acordo. De onde deveria vir o socorro é exatamente onde, atualmente, mora o perigo. Só nos resta o Congresso Nacional como último refúgio e esperança de socorro, mas, confesso, é muito tênue minha esperança. As notícias não são boas; consta que o TSE fez um convênio com a Anatel para tornar mais rápida o cumprimento das suas decisões. Num primeiro momento, pode-se pensar que isso venha para o bem, mas os exemplos da última eleição federal não conduzem a essa conclusão.

Honório Dubal Moscato -   19/12/2023 14:46:47

Professor Puggina, seus textos vão além da crítica, que, além de pertinente e profundamente inquietante, são aulas a todos nós, seus leitores. Impossível não quedar-se em meditações acerca de seus ensinamentos. Afetuoso abraço.

marisa van de putte -   19/12/2023 14:13:17

Gostaria de compartlhar um artigo que recortei de um jornal brasileiro e que usei em minha sala de aula com diplomatas americanos. Democracia versus Liberdade. portal.al.go.br Data:09 de Dezembro de 2008. Tambem foi publicado no "Diario da Manha."de 11 .11. 2008 escrito pelo deputado Ozair Jose{PP}. Para concluir diria que so os incautos acreditam que democracia esteja ligada a liberdade. A democracia que apregoam, hoje, e para ingels ver.

dagoberto -   19/12/2023 10:09:17

Parabéns pela perseverança!

ANTONIO MORALES -   19/12/2023 09:41:52

E não é possível um poder desmedido desses sem que a aliança seja entre detentores dos meios de produção e financeiro com o Estado Leviatã. Hoje temos governos e tribunais originalmente constituídos democraticamente com mais poder acumulado do que antigos monarcas absolutistas.