• Carlos I.S. Azambuja
  • 12 Setembro 2014

 

Os comunistas, que sempre estão em minoria, trabalham para propagar sua influência além de seu número, formando coalizão com ouros grupos, entidades civis ou partidos, em nome de alguma causa comum para depois irem, gradativamente, ocupando os espaços e os cargos dirigentes de todo o movimento.

Objetivam, com isso, insinuar sua linha política na consciência dos demais, de forma que, instintivamente, todos comecem a falar o idioma comunista, exigindo medidas definidas como de seu programa mínimo

Recorde-se que seu carro-chefe nos anos 80, após a anistia de 1979, no Brasil, foi o fortalecimento da sociedade civil.

Através da infiltração sistemática, a rede de instituições que conforma a sociedade civil é levada, sutilmente, a conjugar suas reivindicações específicas com as palavras-de-ordem definidas pelo partido como capazes de mobilizar as forças contrárias ao regime em uma ampla frente.

Essa expressão – sociedade civil –, foi hoje incorporada de tal forma ao uso corrente que passou a fazer parte dos discursos e pronunciamentos de parlamentares e demais autoridades. Alguns sem mesmo conhecer o seu real e abrangente significado, citando-a na presunção de que exista uma sociedade militar, e não para estabelecer um parâmetro entre ela, a sociedade civil, e a sociedade política.

Eles, os comunistas, procedem baseados em um planejamento calculado e concebido para influenciar os não-comunistas, enquanto que estes últimos atuam como indivíduos, isoladamente, que querem realizar uma obra e sabem que os problemas a resolver são complexos. Os comunistas estão isolados de qualquer influência recíproca por sua ideologia, por seu desprezo aos liberais burgueses e pelo sentido de superioridade que lhes proporciona o saber que são eles quem, de fato, manejam a situação.

Outra finalidade da atuação em frente ampla, frente única, frente popular, pacto comum ou qualquer que seja a denominação que, de acordo com as circunstâncias, se lhes dê, é converter o maior número possível de pessoas em grupos de influência submetidos ao seu comando.

O partido dá, também, muito valor a abaixo-assinados onde constem as assinaturas de conhecidos liberais não-comunistas, que não viram motivos para dizer não aos companheiros de luta. Igualmente às concentrações de massas e atos públicos, nos quais esses mesmos liberais aparecem como comissão de frente.

Embora na maioria dos casos não consigam influir na política governamental, os comunistas sempre são vitoriosos, porque criam uma situação na qual um grupo de liberais não-comunistas compartilha de seu fracasso.

Na medida em que esses companheiros de fracasso, por suas posições, vão sendo jogados para a oposição ao governo, tenderão a dizer desse governo e de seus dirigentes o mesmo que os comunistas.

Ademais, a experiência compartilhada do fracasso abranda, quase sempre, a atitude para com o partido, fazendo essas pessoas mais receptíveis às suas interpretações sobre os problemas nacionais e a forma de solucioná-los.

Os comunistas colocam a reforma em um extremo da escala e a revolução em outro extremo, com a reação entre ambas. Encaram os reformadores e os reacionários como preservadores do status-quo.

O inimigo principal dos comunistas, porém, não é a reação, que por sua própria resistência às mudanças contribui para a criação de uma situação revolucionária, e sim os reformistas que, ao melhorarem as condições de vida do povo, contribuem para a redução das tensões das lutas de classes, dificultando, assim, o triunfo dos comunistas.

Entretanto, o partido não pode opor-se abertamente à reforma da mesma maneira que, com efeito propagandístico, se opõe à reação, pois fazê-lo equivaleria a perder o apoio das massas que, corrompidas pela democracia burguesa e carecendo de consciência de classe, preferem apenas uma pequena melhoria a uma melhoria total, que dependerá de um vasto descalabro revolucionário.

Em conseqüência, desempenham os comunistas a estranha tarefa dual de aparentar aliança com os reformadores para, ao mesmo tempo, tratar de desacreditá-los e impedir que resolvam os problemas o suficiente para aliviar as tensões. Para essa tarefa, a frente, o pacto, a aliança, ou seja lá o nome que receba, oferece um campo de manobra ideal, pois legitima a presença dos comunistas junto aos reformadores e aproveitam ao máximo toda ocasião de assumir uma tarefa de vanguarda contra as forças da reação.

Isso permite aos comunistas realizar o que Marx recomendou em seu discurso à Liga Comunista: andar adiante dos reformadores, sendo menos tímidos e mais generosos nas demandas que formulam em nome dos necessitados e descontentes. Gozam também da mesma vantagem de que gozou Lenin quando se propôs derrubar o governo de Kerenski: a de ser irresponsável, ao contrário dos reformadores responsáveis que consideram viável a nossa sociedade e contribuem para que ela funcione, propondo soluções que sejam praticáveis.

Diz um dos princípios básicos do marxismo-leninismo que o governo de qualquer país é um governo de classe e nenhum Estado jamais defende os direitos e promove o bem-estar de mais de uma classe. Em conseqüência, os partidos comunistas dos países não comunistas consideram-se atuando sob um governo inimigo, o qual deve ser destruído.

 

* HISTORIADOR
 

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  • Ruy Fabiano
  • 09 Setembro 2014

 

Entre os desserviços que a Era PT presta ao país, está o de tentar mudar sua história recente. Os heróis da resistência ao regime militar não foram os que apelaram à luta armada, que nada mais fizeram que fornecer pretextos para que o ambiente político se tornasse ainda mais espesso e adverso. Foram as lideranças civis desarmadas – entre outros, Tancredo Neves, Ulysses Guimarães, Paulo Brossard, Sobral Pinto e Raymundo Faoro – que agiram com desassombro, bom senso e eficácia, pondo fim à ditadura sem disparar um único tiro. Com palavras – e nada mais que palavras -, conseguiram convencer os próprios governantes da ineficácia do regime que sustentavam e do desgaste que inevitavelmente recairia sobre as instituições armadas, se se perpetuassem no poder.

O papel do PT nesse processo, a partir de 1980, quando surge, é ambíguo, para dizer o mínimo. Nem é preciso recorrer à denúncia de Ruma Junior, no livro “Assassinato de Reputações”, de que Lula funcionava como informante do regime ao tempo em que mobilizava os sindicalistas para criar um partido. Pouco importa, do ponto de vista prático, se isso ocorreu.

O que importa é que o PT se empenhou em frustrar a estratégia das oposições de formar uma frente única contra o regime. Sabia-se que era propósito – e isso é fato histórico – do governo militar fragmentar as oposições para dividir-lhes os votos e vencer as eleições. E a isso o PT aderiu. Não votou em Tancredo Neves no colégio eleitoral, expulsando três parlamentares seus que ousaram fazê-lo: Airton Soares, José Eudes e Beth Mendes. Opôs-se na sequência a todos os governos pós-redemocratização, infernizando-os com seguidos pedidos de CPI. “Quanto mais CPIs, melhor”, bradava Lula, o mesmo que, no poder, passou a sustentar o contrário.

Não foi a única contradição. Ao assumir a Presidência da República, o partido iria aliar-se a lideranças antagônicas, como José Sarney, a quem Lula chamava de “o grande ladrão do Planalto”, sendo responsável pela ressurreição de alguns oligarcas que antes combatia, como Jáder Barbalho e Fernando Collor de Mello, e o próprio Paulo Maluf.
Esse comportamento, descomprometido com a mais elementar coerência ou senso ético, bagunça o entendimento da História. A Comissão da Verdade, cuja contradição básica consiste em tornar juízes os que são parte no que se está julgando, faz crer que a luta armada foi o ponto alto da resistência e derrubada do regime e que não cometeu pecado algum, já que até seus erros, que não são poucos, são atribuídos ao adversário.

Ao mesmo tempo, transforma a anistia em algo a ser revogado. Nunca antes – neste e em qualquer país – alguém fez isso. Anistia significa perpétuo esquecimento – ou não é anistia. Não significa que não se deva saber o que ocorreu, até porque a História, além de memória, é o grande tribunal dos erros do passado. Mas a anistia não leva esses erros, por mais hediondos, para o futuro. Ou, repita-se, não é anistia.

A democracia brasileira, mais uma vez ameaçada por uma agenda autoritária, que inclui censura à mídia e aparelhamento ideológico do Estado (vide decreto 8.243), depende mais uma vez da ação de lideranças civis desarmadas.

Só que hoje, diferentemente do que ocorria nos anos 70, ao tempo da distensão política, promovida pelo general Geisel, não há sociedade civil organizada. Há sociedade civil aparelhada. Não há na OAB um Raymundo Faoro, nem na ABI um Prudente de Moraes Neto (que representou a entidade dos jornalistas na interlocução com o regime em prol da redemocratização), nem no Congresso um Ulysses ou Tancredo.

O atual presidente da OAB, Marcus Vinicius Coelho, que mantém a entidade em silêncio desde sua posse, integra a lista dos candidatos à vaga de Joaquim Barbosa ao STF. Todas essas instituições converteram-se à categoria de “movimentos sociais” e seguem a cartilha ideológica em curso. A reação depende hoje da sociedade civil desorganizada, com protestos aleatórios nas ruas e nas redes sociais, mas que tem nas próximas eleições a oportunidade de optar entre seguir em frente ou mudar. A opção não será entre candidatos, mas entre projetos, cujos efeitos hão de determinar o país não do próximo mandato, mas das próximas gerações.

* Jornalista
 

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  • Antônio Augusto Mayer dos Santos
  • 08 Setembro 2014

Em tempos de pacto federativo – o novo lero-lero convertido em retórica salvacionista – a desproporcionalidade nas representações regionais junto ao Congresso Nacional é uma anomalia histórica tolerada sem esboço de reação.

Indiferentes e soberanos às tímidas tentativas de ajuste ou correção pela via legislativa, os 20 estados que formam as regiões Norte (7), Nordeste (9) e Centro-Oeste (4), embora reunindo menos da metade da população brasileira (43%), monopolizam 74% das 81 cadeiras do Senado Federal.

Na Câmara dos Deputados a situação não é outra quando as mesmas bancadas controlam 50,1% das cadeiras (257), enquanto que os deputados oriundos das 7 unidades que formam as regiões Sul (3) e Sudeste (4), as mais industrializadas e populosas do país (IBGE 2010), preenchem 49,9% (256). Também a maior parte dos eleitores está localizada na região Sudeste, que concentra 43,44%, somando 62.041.794 pessoas (TSE 2014), e o maior colégio eleitoral se localiza no estado de São Paulo, com 31.998.432 eleitores (TSE 2014).

Tanto a sobre-representação daquelas primeiras quanto a sub-representação das demais foram introduzidas pelo Código Eleitoral de 1932 e incrementadas a partir da Constituição Federal de 1934. É indisfarçável que essas normas, reproduzindo os desmandos e despotismos vigentes à época, sacramentaram uma federação mutilada e parlamentarmente deformada, onde a representação de várias unidades goza de um peso extra refletido através de desigualdades na formação de comissões, votações, etc. De lá para cá, a situação se consolidou. Aliás, conforme recentemente lembrou o jornalista e escritor Laurentino Gomes, tais distorções são fortemente enraizadas e tem origem no Império, quando “os conservadores tinham representação mais forte nas províncias do Nordeste e, em geral, favoreciam a centralização do poder imperial, enquanto os liberais representavam as províncias do Sul e do Sudeste – especialmente São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul – e defendiam uma maior descentralização em favor da economia regional” (2013, p. 106).

O Brasil da década de 30, aquele queera tipicamente rural, não dispunha de urna eletrônica eonde pouco mais de 6% da população brasileira votava, estabeleceu um federalismo ilusório, assentado numa representação congressual fictícia onde a maioria da população elege menos representantes do que deveria e a minoria elege além do que devia.
Diante de configurações políticas desnaturadas pela desproporcionalidade – e pela complacência –, a representação dos estados perante o Parlamento não é autêntica.

*Advogado eleitoralista
 

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  • Paulo Briguet
  • 06 Setembro 2014

 

1. Reles cronista que sou, não tenho capacidade para mudar a opinião de ninguém, nem mesmo dos meus sete generosos leitores. Mas gostaria de dizer sete palavras aos amigos (inteligentes e bem-intencionados) que pretendem votar em Marina Silva e acham que ela é uma alternativa ao PT. Quem pensa assim, lamento dizer, não sabe o que é o PT. Não compreende a verdadeira natureza do Partido dos Trabalhadores. O PT é muito mais que um partido; é um movimento voltado à ocupação do poder e ao controle social em todo o continente. Seu verdadeiro nome é Foro de S. Paulo, entidade que hoje controla a maioria dos governos na América do Sul. Ganhe Dilma ou Marina, o controle da máquina estatal continuará sendo exercido por essa mesma entidade.
2. Acompanho atentamente a trajetória política de Marina Silva desde os tempos de Chico Mendes. Marina é uma petista de corpo e alma; militou no partido por três décadas e só saiu diante da perspectiva de ser candidata à Presidência da República.
3. Quando ocorreram as manifestações em 2013, eu avisei: isso vai dar PT. PT no sentido de perda total. Fui muito criticado por isso, mas nem nos meus momentos mais pessimistas poderia imaginar que o segundo turno se daria entre duas candidatas do Foro de S. Paulo. Dilma versus Marina é eleição de DCE.
4. A maior prova do DNA comum entre Dilma e Marina está na linguagem. O dilmês e o marinês são idiomas incompreensíveis. E essas línguas de madeira são utilizadas na hora de defender aberrações como o tal projeto de lei que institui a ditadura dos conselhos (sovietes) sobre o País.
5. Outra característica comum entre as duas candidatas de alma petista: elas se aproximam do metacapitalismo. Seus apoiadores, em geral, são aqueles empresários e banqueiros “companheiros de viagem”, amigos do rei que lutam incansavelmente por uma economia de mercado sem concorrência.
6. José Dirceu já mandou avisar por interlocutores: “Marina é o Lula de saias”. José Dirceu, você venceu.
7. Nova política, como diria o padre Quevedo, non ecziste.

* Jornalista

www.jornaldelondrina.com.br/blogs
 

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  • Ives Gandra da Silva Martins
  • 05 Setembro 2014

Dois decretos governamentais (8242 e 8243) podem afetar o regime democrático e a ação social das Instituições sem fins lucrativos, principalmente as católicas.

O primeiro cria inúmeras restrições às imunidades garantidas pela Constituição, matéria que é objeto de ação direta de inconstitucionalidade no STF (nº. 2028) de relatoria do Ministro Joaquim Barbosa e de repercussão geral da relatoria do Ministro Marco Aurélio, com resultado, até o momento, favorável às Instituições (4x0 – votos dos dois Ministros relatores e dos Ministros Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia). Se prevalecerem as ações (ADI e RE) o decreto perderá validade.

O segundo institui a Política Nacional de Participação Social – PNPS. Tal como descrita no Decreto 8243/14, tende a substituir o Congresso Nacional na representação popular, para “fortalecer e articular mecanismos e instâncias democráticas de diálogo” e em “atuação conjunta com a administração pública federal” da “sociedade civil” (art. 1º), criar Conselhos e Comissões de políticas públicas e sociais (artigos 10 e 11) eleitos pelo povo, objetivando auxiliar a Secretaria Geral da Presidência da República (artigo 9º) a “monitorar e implementar as políticas sociais” por eles definidas, com atuação junto às diversas instâncias governamentais.

Num curto artigo, é impossível descrever e analisar o nível de força que se pretende atribuir a instrumentos “populares”, na promoção com o governo, das políticas que desejarem, sem a participação dos legítimos representantes do povo, que são os senadores e deputados. Como os Conselhos e as Comissões serão eleitos pelo “povo”, mas a eleição não é obrigatória e o “povo” dificilmente terá condições de dedicar-se em tempo integral, deixando trabalho ou ocupações diversas, para estar presente nestas “eleições”, serão os “amigos do rei” os beneficiados pelas indicações, que lá estarão presentes, num verdadeiro aparelhamento do Executivo e redução do Congresso Nacional à sua expressão nenhuma.

Por pior que seja, o Legislativo é eleito pelo povo. Nele está contida 100% da representação popular (situação e oposição). No atual Executivo, nem 50% do povo brasileiro está representado, pois a atual presidente teve que ir ao 2º turno para ganhar as eleições. Em outras palavras, pretende o decreto que a autêntica representação popular de 130 milhões de brasileiros seja substituída por um punhado de pessoas,que passará a DEFINIR A POLÍTICA SOCIAL DE TODOS OS MINISTÉRIOS, INDICANDO AO EXECUTIVO COMO DEVE AGIR!

A linha da proposta é tornar o Congresso Nacional uma Casa de tertúlias acadêmicas, pois os Conselhos e Comissões eleitos pelo “povo” serão aqueles que dirigirão o país. Por exemplo, a Comissão encarregada da Comunicação Social poderá determinar que o Ministério correspondente imponha restrição de conteúdo à imprensa, a pretexto de que é esta a “vontade do povo”, que será “obrigado” a atender aos apelos populares. As políticas públicas e sociais não mais serão definidas pelo Poder Legislativo, mas, por este grupo limitado de cidadãos enquistados nestes organismos.

Estamos perante uma autêntica ressurreição, da forma mais insidiosa e sorrateira, do PNDH-3, que recebeu o repúdio nacional e, por isto, nunca foi aplicado. Às vezes, tenho a impressão, com todo o respeito que tenho pela figura da presidente da República, que ela tem recaídas “guerrilheiras”. Talvez, a “devoção cívica” que demonstrou nutrir pelo sangrento ditador Fidel Castro – tão nítida no retrato exibido por todos os jornais, de sua recente visita a Cuba – a tenha levado a conceber e editar esta larga estrada para um regime antidemocrático. É que o decreto suprime as funções constitucionais do Parlamento e pretende introduzir entre nós o estilo bolivariano das Constituições da Venezuela, Bolívia ou Equador. Nelas, o Executivo e o “povo” são os verdadeiros poderes, sendo –é o que está naquelas leis maiores— o Legislativo, Judiciário e Ministério Público, poderes acólitos, vicários, secundários e sem maior expressão.

Por ter densidade normativa própria, o referido decreto é diretamente inconstitucional, ferindo cláusula pétrea da Constituição, que é a autonomia e independência dos Poderes (artigos 2 e 60 § 4º, inciso III). spero que o Congresso Nacional repila o espúrio diploma, com base no artigo 49, inciso XI, da Carta Maior, zelando, como deve, por sua competência legislativa.

* * Advogado, professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra
 

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  • Olavo de Carvalho
  • 05 Setembro 2014

 


No último número da elegante revista do Banco Itaú Personnalité, Ruy Castro enfatiza o contraste entre duas fases da existência do poeta Vinícius de Moraes:

"Há um Vinícius de Moraes sobre o qual não resta a menor dúvida: ... o compositor, o letrista e o showman; o diplomata, o homem do mundo e o amigo de ilustres; o boêmio, sempre com um uísque a bordo, e o liberal, o homem de esquerda, com muitas amizades entre os comunistas; o cantor da beleza, o homme à femmes, que se casou nove vezes e vivia em permanente estado de paixão; o capitão do mato e o branco mais preto do Brasil, na linha direta de Xangô; o diletante da crônica, do teatro e do cinema..."

"Mas houve também um Vinícius tão real quanto esse acima, e que seus admiradores mal conseguiriam reconhecer se descrito sem as necessárias ressalvas. Um Vinícius profundamente católico, metafísico, passadista, politicamente de direita, simpático ao fascismo, íntimo de assombrações, inimigo do cinema falado, alérgico ao jazz moderno, desconfiado da juventude – e olhe que ele também era jovem – e certo de que o sexo era uma coisa apenas espiritual. O que? Sim, esse era o Vinícius de 1933."

Sim, esses dois Vinícius existiram, e, se o do primeiro parágrafo é ainda um personagem popular decorridos trinta e tantos anos da sua morte, o do segundo permanece tão desconhecido que Ruy Castro tem de revelá-lo a um grupo de admiradores estupefatos, numa revista de poucos e requintados leitores.

Só há um problema. O "Vinícius de 1933", que Ruy Castro descreve em termos que fazem dele um monstrinho antediluviano, era, malgrado algumas esquisitices inegáveis, um dos poetas mais sérios e profundos do idioma. Já o Vinícius nacionalmente conhecido – para Ruy Castro, o único normal e digno de admiração irrestrita – nunca passou de uma figura do show business, um velho caricato macaqueador da moda juvenil, gabando-se de ser "o branco mais preto do Brasil", mas bebendo uísque importado em vez de cachaça, namorando populisticamente mulheres da alta sociedade, e escrevendo nada mais que sambinhas autocongratulatórios e umas frases de efeito que se conservaram na memória nacional não por meio da história literária, mas da indústria de discos e do governo que ele tanto ludibriou, vivendo de dinheiro público sem nem marcar o ponto na repartição.

"A vida é a arte do encontro embora haja tantos desencontros pela vida", "A mulher amada é o tempo passado no tempo presente no tempo futuro no sem tempo", "Quem já passou por essa vida e não viveu pode ser mais, mas sabe menos do que eu...", "Quem de dentro de si não sai vai morrer sem amar ninguém" e milhares de tolices semelhantes, que parecem ter sido produzidas especialmente para diários de moças, assinalam com toda a clareza a decomposição de um talento de poeta e de um caráter de homem, diluídos em álcool para mais rentosa distribuição comercial.

Não é coincidência, de maneira alguma, que essa transfiguração da literatura em cocô acompanhasse pari passu a aproximação cada vez mais íntima do poeta com os grupos de esquerda, que naqueles anos da ditadura precisavam desesperadamente de poster men. Se para servir a esse fim um grande homem tinha de ser infantilizado por meio de paparicações grudentas e seduções corruptoras, tanto melhor.

Era uma política consciente. Lembro, como se fosse hoje, o zunzum entre os comunistas da redação quando Carlos Alberto Libânio Christo, o "Frei Betto", veio trabalhar na Folha, naquele intervalo de retorno ao ambiente profano, que nos seminários precede a opção definitiva pela ordenação sacerdotal. Era necessário, era urgente, comentavam, fazer amizade com o padreco, embebedá-lo, levá-lo a boates e puteiros, fazer dele um membro em regra da patota dos bons.

A ética por trás disso era a boa e velha inversão: já que a sociedade burguesa é corrupta e hipócrita, é preciso combatê-la desde dentro por meio da corrupção ostensiva, exibida, orgulhosa de si. Os serviços prestados ao Partido santificavam tudo. Quando Vinícius trocou o cristianismo por uísque, mulheres, samba e comunismo, tornou-se um modelo de virtudes.

Às vezes não era preciso chegar a tanto. O Partido sabia tocar o ponto sensível de cada um. Se o alvo escolhido fosse um pobretão apavorado com a perspectiva de morrer de fome, como Otto Maria Carpeaux, bastava oferecer-lhe empregos em troca de favores prestados, depois ir pedindo cada vez mais favores até que consumissem por inteiro o tempo e os talentos do infeliz, bajulando-o e aplaudindo-o à medida que se imbecilizava cada vez mais.

O apoio na hora da encrenca sempre deixava marcas fundas. Roland Corbisier, brilhante intelectual do Partido Trabalhista, intermediou o apoio dos comunistas à candidatura de Negrão de Lima ao governo do Rio em 1965, foi demitido do Ministério da Educação pelos militares e acabou fisgado. Virou o típico "bom sujeito": divorciou-se da mulher, abandonou a Igreja e, de seus primeiros livros, A Responsabilidade das Elites e Formação e Problema da Cultura Brasileira (ambos de 1956), estudos magníficos sobre a vida intelectual no Brasil, passou a escrever manuais de marxismo-leninismo dignos da Academia de Ciências da URSS.

À medida que o gramscismo se consolidou como doutrina dominante nas universidades, a política de cooptação perdeu seu caráter de seleção individual e se tornou o critério geral de aprovação na carreira acadêmica e jornalística, a conditio sine qua non para os neófitos serem reconhecidos como "intelectuais". A imbecilização industrializou-se e a cultura superior no Brasil acabou.

 

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