Pelo que se pode notar nas declarações públicas de petistas notórios, a estratégia para os próximos anos já está traçada. Começou o abandono do partido e a construção de uma versão alternativa dos fatos. Tudo para que o sonho socialista siga vivo em outro partido, redimido por uma narrativa dos fatos que, embora fantasiosa, seja suficiente para animar o militante. O testamento entrega a outros partidos a busca do socialismo; o obituário deixa uma mentira no lugar da história.
O obituário petista proporá que houve duas causas para a morte. Uma, a insatisfação por não ter entregue tudo o que prometeu. Outra, a oposição das elites dominantes ameaçadas em seu poder. Ambas são falsas, mas serão eternamente repetidas pela baixa intelectualidade esquerdista.
A rejeição do PT não ocorre por suas “promessas irrealizadas” – ela é resultado direto daquilo que ele realizou. Os governos petistas, no plano econômico, apostaram no fomento ao consumo sem produção, na concessão de crédito sem poupança, na distribuição sem criação de riqueza, na satanização do empregador e na aliança do BNDES com os empresários amigos. A conta haveria de bater, e a crise que já vivemos é a fatura desta conta. Como Thatcher disse, o socialismo acaba quando termina o dinheiro dos outros. Como todo economista sério alertava que iria acontecer, o modelo petista ruiu.
No plano político, o PT apostou na corrupção como principal forma de dar “liga” na base de apoio. Ao passo em que concentrava poder no executivo federal, acreditava que enquanto a base estivesse com os bolsos cheios, não incomodaria. A ruína das instituições brasileiras aconteceu aberta e deliberadamente, com sustentação na pretensão de reconstruir um Brasil mais parecido com os amigos bolivarianos. O mensalão e o petrolão não são acidentes na história petista – são a principal política petista de formação de uma base de apoio no Congresso. Vários partidos estenderam a mão para receber as propinas milionárias, mas a mão pagadora sempre levava uma estrela.
A terceira estrofe do falso obituário é a tese da direita dominante e seu ódio ao PT. Bastaria, para desmenti-la, olhar para as manifestações de rua e a imensa pluralidade de pessoas que saíram de casa reclamando do PT. Bastaria, talvez, abrir as contas do BNDES – até hoje fechadas – para entender como a verdadeira elite dominante esteve abraçada a Lula e Dilma para ter a chave do cofre à sua disposição. E seguramente bastaria caminhar pelas ruas e ouvir as pessoas, para entender que o antipetismo tem matiz moral, e não econômica; pede decência, e não privilégios.
Com a história recontada, como a esquerda gosta de fazer a cada desastre do socialismo, o PT deixará a outro partido a missão de levar o Brasil à desgraça. Esse é o seu testamento. Sua missão foi cumprida – é hora já dos parasitas abandonarem o corpo para buscar outro hospedeiro.
Começar por onde? Pelo aumento do desemprego? Ou da rejeição à Dilma, agora na casa dos 65%?
Pela decisão do Tribunal de Contas da União de pedir explicações ao governo sobre manobras fiscais? A decisão pode dar vez a um processo de impeachment contra Dilma.
Ou começar pelo desabafo de Lula detonando Dilma, o PT e ele próprio? Ou ainda pela prisão surpreendente dos dois maiores empreiteiros do país?
A prisão dos empreiteiros remete à Queda da Bastilha. Só havia por lá sete presos quando o povo de Paris tomou-a de assalto. Os presos foram libertados.
A cabeça do diretor da prisão desfilou pela cidade espetada na ponta de uma lança.
A Bastilha era um símbolo do poder absolutista dos reis. Sua queda virou um marco da Revolução de 1789 que mudou a França e repercutiu no mundo todo.
Até que a Bastilha fosse destruída, tinha-se como inconcebível que a ralé pegasse em armas para varrer o regime. Os reis eram figuras divinas.
Por aqui, parecia inconcebível que Marcelo Odebrecht, herdeiro de um império que faturou R$ 107 bilhões no ano passado, fosse parar na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, obrigado a comer quentinhas. Ele e o presidente da Andrade Gutierrez .
E não só pela fortuna que Marcelo amealhou, capaz de realizar todos os seus desejos de consumo, e também os desejos das próximas gerações dos Odebrechts.
Mas principalmente pelas conexões políticas e econômicas que Marcelo estabeleceu com políticos e governantes daqui e de uma dezena de países. Lula virou seu empregado. E, junto com Dilma, refém do que Marcelo sabe.
Se o mais poderoso empresário brasileiro decidisse colaborar com a Justiça, a República literalmente cairia.
Imagine se viessem à luz detalhes de um dos encontros de Marcelo com Dilma no ano passado, quando ele fez um circunstanciado relatório sobre os bastidores dos negócios entre as empreiteiras e a Petrobras? Por essa e outras, ele jamais imaginou que seria preso.
Em novembro último, durante encontro com os executivos do Grupo Odebrecht em Costa do Sauipe, na Bahia, Marcelo se sentia tão inatingível que os aconselhou: “Se algum de vocês for preso, conte tudo. Que eu me apresentarei e contarei tudo”.
Não se animem! O maior patrimônio de Marcelo, a essa altura, não é a Odebrecht. É sua memória. E os documentos que guarda. Não falará.
Lula está furioso com a companheira Dilma. Ele a acusa de não ter usado o poder do cargo para impedir que a Operação Lava-Jato, comandada pelo juiz Sérgio Moro, chegasse até onde chegou.
Mas como Dilma poderia atender à vontade de Lula se ela se reelegeu com base em mentiras, lidera um governo cada vez mais fraco, e seu desempenho só é aprovado por 10% dos brasileiros?
O fato é que Lula cobra de Dilma o que ela não pode dar. Ou talvez não queira dar.
Poucas coisas boas ficarão do período Dilma. Uma delas, a justa fama de não ter atrapalhado o combate à corrupção. Ela quer ser lembrada como a "faxineira ética".
As críticas de Lula a Dilma, compartilhadas com os religiosos que o visitaram no Instituto Lula, deixam nu um político que não entende a real dimensão da crise do PT e da esquerda.
A crise deriva dos erros cometidos por Lula e Dilma. O pai da crise é ele. A mãe, ela.
De nada adianta Lula sugerir a Dilma que vá para a rua falar com o povo. Ela não tem o que dizer. O PT, tampouco.
Envelheceram o discurso e os métodos do Sr. Brahma, como Lula foi chamado por alguns empreiteiros.
É um ciclo político que se esgotou. Apenas isso, e nada mais.
Publicado originalmente em O Estado de S. Paulo
Se há uma característica que o ex-presidente Luiz Inácio da Silva mantém inabalável – ao menos em público – é a autoconfiança. Impressionante. O mundo está desabando ao seu redor e ele ali, impávido, dando lição de moral como se nada tivesse a ver com o desmonte em questão.
É um especialista no tema. Um esperto, sobretudo, no que tange ao ofício da enganação. Encontra paradeiro em Paulo Maluf, mas vai além, pois sabe como capturar simpatias, despertar sensações respeitáveis, aliviar e fazer pesar consciências. Tudo na medida de suas conveniências.
Assim se mantém em evidência. Como personagem, um fascínio na capacidade de se repetir e, ainda assim, surpreender pela desonestidade de ação e pensamento.
Como político, um vivaldino que dá sinais de esgotamento. Lula parece estar em grande dificuldade para achar a saída do labirinto em que se encontra. Ele, seu partido e o governo da presidente cuja qualificação e excelência Lula afiançou ao País.
Em duas ocasiões recentes, reunido com correligionários, o ex-presidente fez observações extremamente depreciativas em relação ao PT e a Dilma Rousseff. Chamou o partido de velho, fisiológico, interesseiro e oportunista. A presidente acusou de mentirosa, por dizer uma coisa na campanha eleitoral e fazer outra, e ainda chamou o gabinete de trabalho da companheira de “desgraça”, uma usina de más notícias.
Evidentemente Lula sabia tanto do efeito de tais declarações como estava ciente de que elas seriam devidamente divulgadas. Não quisesse ver nada disso publicado teria mantido a boca fechada, como de resto faz quando lhe interessa. Se fala, tem um propósito.
Ao dizer, por exemplo, que é o “próximo alvo” da Operação Lava Jato depois que os investigadores chegaram ao topo do núcleo empresarial, o ex-presidente procura criar um clima de suspeição – como se estivesse sendo vítima de perseguição –, aplicar uma espécie de vacina para o fato de que é mesmo alvo da desconfiança de que teria o domínio de todos os fatos ocorridos sob a sua presidência.
Quanto à diatribe direcionada ao PT, Lula comporta-se como o comandante responsável pela manobra desastrosa e que na hora do naufrágio salta na frente dos outros no bote salva-vidas.
Prega uma “revolução” no partido quando acabou de orientar o PT a adotar uma posição conformista em seu 5.º Congresso, onde toda crítica e autocrítica foi devidamente interditada em nome da preservação do governo da “companheira Dilma” e da sobrevivência eleitoral da nação petista.
Esta a prática. O discurso (na direção oposta) pelo visto tem a finalidade de construir uma realidade paralela em que ele aparece como o grande indutor da renovação, crítico severo da banda podre, guia genial dos novos tempos.
Como se vê pelas pesquisas que apontam a perda acentuada de densidade de Lula junto à população, o problema é que já não há tanta gente disposta a cair nessa conversa. Se o PT perdeu a utopia, como ele diz, foi Lula quem exigiu do partido o mergulho na era do pragmatismo.
Ditou o rumo nos últimos anos, elogiou os meios e modos do partido, desqualificou os que se tornaram dissidentes por discordarem do caminho imposto por ele e várias vezes ignorou todos os alertas. Preferiu dobrar apostas, agredir, alimentar a cizânia, disseminar a ideia de que o exercício da oposição era sinônimo de golpismo.
O estoque de truques se esgotou. Perdido, Lula distribui acusações a respeito das quais é o maior responsável e de cujos resultados ele foi, e ainda é, o mais alto beneficiário.
Era minha primeira aula do curso de Direito. Meu primeiro dia na universidade. Abriam-se para mim as portas de um novo mundo, por onde eu entrava com o espírito dos conquistadores.
Não, não era com a advocacia que eu sonhava. Meu desejo era ser um arquiteto. Casar com o meu primeiro amor, tão arrebatador. Mas a mãe de minha namorada me considerava um playboy, um rapaz sem futuro. Não “fazia gosto” de mim, como se dizia então.
Premido por essa contingência, eu me inscrevi para o vestibular no curso de Direito. Uma estrada larga em comparação com o caminho estreito da Arquitetura. E conquistaria o respeito de minha eventual futura sogra. Que acabou não sendo.
Eu jamais frequentaria a faculdade de Arquitetura, mas conclui meu curso de Direito. E meu pai montou para mim um escritório de advocacia ricamente mobiliado e com a biblioteca completa de um dos mais famosos advogados do meu estado, recentemente falecido. Convida para sócios alguns de meus colegas, que mais tarde se tornaram juízes, desembargadores. Nenhum deles advogou. Muito menos eu.
Hoje, passado o tempo que lembra uma eternidade, parece que foi ontem. E olhe que eu já viajei de jardineira em estrada de terra e de trem de ferro com locomotiva a vapor. Ontem dentro de mim, mas uma eternidade no que distancia aquele tempo do tempo que agora me parece de outro mundo. De um país que se chamava Brasil.
Ainda não me dei conta de que sou velho. Mas não posso ignorar que eu seja vintage. E bota antigo nisso!
Perdi o fio da meada? Não. Essa digressão veio a propósito do título deste artigo – ubi societas ibi jus.
Com essa expressão latina, escrita a giz pela minha professora de Introdução à Ciência do Direito, eu fiquei sabendo que a lei se examina na sociedade. Ou que é assim para quem adota a doutrina do jusnaturalismo, antítese do juspositivismo.
Foi diante dessa encruzilhada que o meu Brasil ficou tão distante, porque tão estranho àquele que eu conheci. Tendo tomado opção pelo juspositivismo, a ética –código escrito por Deus em nossa consciência – foi sendo revogada até que a sociedade deixou de informar o Direito. Este é que passou a conformá-la segundo as ideias e os interesses daqueles que detêm o poder de legislar, executar o foi legislado e julgar as normas que regulam as relações entre o Estado e a sociedade. Com a evidente e brutal supremacia daquele sobre esta. Ubi jus ibi societas. O intelecto se atribuiu a primazia de insculpir na consciência humana o código da sua conduta social. E da pessoa natural fez um ser artificial que aos poucos vai se agregando a outros até que a humanidade realize a utopia socialista na moldura de um rebanho de robôs a serviço de seus governantes.
Se eu nunca tive vocação para abraçar a ciência do Direito – que Karl Marx condenou como “um instrumento de opressão” entre as classes que compartimentam a sociedade – ao concluir que ele se tornou um instrumento para o Estado subjugar a sociedade eu passei a desprezá-lo nessa metamorfose satânica que rompeu com sua história, que remonta aos primórdios da civilização que sob ele se erigiu.
Sei que preciso me conformar para não morrer como um arquiteto frustrado. E tenho, felizmente, para me consolar, a lembrança de que à época em que seria um estudante de arquitetura meus professores eram, todos eles, discípulos de Bauhaus, Le Corbusier, Niemeyer e outros monstros sagrados que inspiraram gerações a projetar pombais monumentais envoltos em vidro fumê para servirem de residência coletiva, fornos horizontais de concreto com compartimentos refrigerados e iluminados artificialmente para as pessoas trabalharem, um palácio de governo que sugere um palanque modernoso e uma catedral que mais parece um cacho de bananas virado de cabeça pra baixo. E eu não ficaria conhecendo, na Faculdade de Direito, a colega com quem me casaria. Meu último amor. Definitivo. Que se confunde comigo num café com leite matutino, bebido em todos os dias de nossa vida peregrina.
E que me permite, à noite, ser o boêmio de sempre. Quase sempre solitário depois que a Lua dobra o nadir. Que me faça má companhia, este sim, não ela, só o inconformismo com a subversão de uma ciência que, ao invés de nos proteger estabelecendo o equilíbrio dos pratos da balança pelo fiel da Justiça, de olhos vendados para não distinguir ninguém, mas a todos igualar com isenção absoluta.
Segundo o direito positivo, que aqui relegou o direito natural aos rudimentos da ciência jurídica, como a alquimia em relação à química, o impeachment de um presidente não é uma questão política. Porque não pode se examinar na sociedade. Quem pode julgar essa questão legal são os ministros da Justiça. Cumpra-se e se faça cumprir a lei. Revogue-se o povo em contrário.
A década de 1960 foi emblemática como fundamentação para o statu quo ora vigente no planeta, nomeadamente quando a análise recai sobre o continente sul-americano, ainda que não exclusivo deste. Os fatores que interferem nesta assertiva são múltiplos, não obstante possam ser condensados em apenas um: a dependência ideológica latino-americana ao pensamento predominante à época, estampado na famigerada declaração do furibundo ditador cubano, Fidel Castro, e seu escudeiro-mor, Ernesto “Che” Guevara. Um chavão popular ecoava pelos quatro cantos do nosso continente: “Soy marxista-leninista y seré marxista-leninista hasta el último día de mi vida”, bradava ensandecido o autocrata Castro, enquanto todas as emissoras de rádio – exceções feitas a raríssimas e renitentes emissoras “reacionárias” (sic) – o reproduziam incansavelmente, infestando as frágeis e facilmente manipuláveis mentes de educadores e educandos em sentido lato. A juventude, sem realmente saber o porquê, exultava, bradava de forma animalesca, agredia, depredava, ao som da insanidade castrista.
França (essa inesgotável e histórica fonte revolucionária) ditava o tom revoltoso para o mundo. Maio de 1968 tornou-se um marco referencial na história dessa grande e culta nação (um paradoxo), contagiando todo o Ocidente. Nada menos que dez milhões de grevistas e um milhão de estudantes paralisam o país durante um longo e conturbado mês (o “maio vermelho”). Sequer o PC francês consegue atender à reivindicação social maciça, denotando às claras seu papel como mera sucursal do stalinismo soviético. Foucault irá demonstrar isto em sua festejada obra “Vigiar e punir” (1975) [[i]].
Dito movimento em nosso continente se espalha tal qual um rastilho de pólvora. Eclodem conflitos de toda natureza, realimentando (e sobrevalorizando) o pensamento revolucionário cubano que incitava ao motim social. Note-se neste detalhe outro aspecto paradoxal: a maioria dos estudantes revoltosos e dos grupos de trabalhadores irascíveis sequer compreendia o que os movia a tal promoção anárquica; se se perguntasse o motivo a um número aleatório deles (como este escriba o fez à época), invariavelmente a resposta seria fugidia, vaga, não raro centrando-se na reprodução impensada, irracional, das frases de ordem deglutidas à revelia. Descobrir isto era até fácil demais: bastava que se fizesse uma pergunta algo mais profunda (v.g., “o quê você espera de um governo comunista?”), para que se recebessem respostas idiossincráticas, repetidas ao modo ‘papagaio’.
Outro aspecto que merece destaque – cuja vigência perdura até o tempo presente e promete eternizar-se – é a brutal dissonância entre o discurso e a prática (novo paradoxo). Desde seu nascedouro, o marxismo-leninismo defende um discurso teorético que seus próprios discípulos decididamente não o praticam, muito menos o compreendem. E isto se deve a uma característica de cunho genético-filosófico que acompanha o ser humano desde priscas eras: seu exacerbado individualismo. Não há como considerar-se um verdadeiro exemplar de homem livre àquele ser individualista “apaixonado por um ideal social, político ou religioso que prescinde dos que não coincidem com ele ou trata de impor-lhes suas ideias e seus interesses erodindo a liberdade dos demais” [[ii]]. Hegel (1953), ao analisar o comportamento dominante durante a Revolução Francesa, refere à liberdade autodestrutiva ou liberdade irreal como aquela em que o sujeito “trata de transformar o mundo movido exclusivamente por seus interesses subjetivos em contenda com a liberdade dos outros” [[iii]]. Tampouco pode se adjetivar como livre o indivíduo que, acomodado num conformismo amorfo, ou ainda, paralisado pelo temor, submete-se injustificadamente às pressões ou às ordens de outrem.
O que é possível inferir-se de todo o exposto? Que a defesa desvairada e cega de ideologias – a exemplo do marxismo-leninismo, apenas para ficarmos no cerne desta discussão – advém do caráter egocêntrico do ser humano que persiste em ver a realidade através de uma perspectiva própria (ou incutida), o que não lhe permite diferencia-la da realidade fática (sentido lato) que o rodeia. “Entender cabalmente a realidade supõe situar-se frente a ela e tomar consciência de si próprio como algo distinto, ainda que vinculado a essa realidade” [[iv]]. Em sentido prático, a verdadeira lavagem cerebral e doutrinamento forçado a que são submetidos os adictos do marxismo-leninismo lhes cega em tal grau que, a partir de um determinado ponto de conscientização forçada (fixação repetitiva) passam a assumir como assentadas mentiras travestidas de realidades. O discurso ininterrupto, persistente e monocórdio se encarrega de sedimentar tais realidades (sic) até que, nas mentes instáveis dos ouvintes frágeis e despersonalizados, tornam-se verdades insofismáveis. O curioso, neste infausto procedimento de doutrinação, é o número pouco significante dos que se arriscam a contraditar fundamentando suas dúvidas, e que acabam por sucumbir sob o peso truculento e abusivo dos principais algozes, à grosseira pecha de traidores.
Permito-me, neste momento do texto, reproduzir um trecho do artigo da lavra do jornalista José Reinaldo Carvalho [[v]], editor do “Portal Vermelho”, com o intuito de ilustrar o afirmado no parágrafo anterior, lembrando ao leitor o fato de este excerto transcrito corresponder apenas a um microscópico grão de areia, na vastidão imensurável do deserto discursivo de milhões de indivíduos como ele, a serviço da mentira e da enganação desvairada e descarada, em prol do marxismo-leninismo hediondo e odioso. Assevera este senhor:
[...] 70 anos depois da vitória dos povos contra o nazi-fascismo, a burguesia e o imperialismo continuam a perpetrar monstruosidades, o sistema capitalista exibe as suas incuráveis chagas e lancinantes contradições, os direitos dos trabalhadores são vilipendiados, a insegurança quanto ao futuro da humanidade é persistente, o direito internacional é aviltado, a paz é ameaçada e o perigo de guerra é corriqueiro e banalizado. [todos os grifos são nossos]
Quanta ousadia e quanta ignorância! Quão fácil é perverter a ignara plebe, sedenta por ser enganada, pisoteada, subvertida. “Monstruosidades”, senhor jornalista, são todas as práticas levadas a termo pelas forças de Fidel e Che Guevara naquilo que cognominaram de “revolução” (melhor seria morticínio desvairado) e que se assemelha mais ao sequestro de todo um povo, mantendo-o em grilhões durante 56 longos anos, assassinando sumariamente os que se insurgiam contra as imposições ditatoriais dos celerados comandantes, expropriando-lhes todos os seus bens e direitos fundamentais, a começar pelo mais sagrado deles, lavrado a ferro e sangue em cláusula pétrea universal: o direito à liberdade. “Monstruosidades” são os atos irracionais e doentios dos dinásticos norte-coreanos, Kim Il-sung, Kim Jong-un e Kim Yong-nam, autoproclamados líderes supremos e eternos, auto-investidos do direito de assassinar qualquer um que se aventure na ousadia de se opor a regime tão hediondo e destrutivo. “Monstruosidades” foram os atos covardes dos mentores da Revolução Bolchevique de 1917 (Rússia), quantificando nada menos que 20 milhões de mortos, em nome das grosseiras e doentias elucubrações de indivíduos como Lênin, Stálin e seus ensandecidos asseclas seguidores. Um quadro extraído da obra editada por Stéphane Courtois (“Le livre noir du communisme: Crimes, terreur, répression” – 1997) expõe alguns números que bem comprovam o que são monstruosidades perpetradas durante os governos que regiam-se (e assim persistem) pelo terror [[vi]]:
Mortos pelo regime comunista – por ordem decrescente:
? República Popular da China: 65 milhões
? União Soviética: 20 milhões
? Coreia do Norte: 2 milhões
? Camboja: 2 milhões
? África: 1,7 milhões
? Afeganistão: 1,5 milhões
? Vietnã: 1 milhão
? Regimes comunistas Europa Oriental: 1 milhão
? Cuba e outros países de América Latina: 150 mil (mínimo estimado)
Num total aproximado de 100 milhões de inocentes (94 milhões, 350 mil indivíduos, resultante da soma dos números ora expostos), o tão propalado regime comunista (marxista-leninista) exterminou até o presente nada menos que 1,5% da população mundial atual, o que, convenhamos, é número assaz considerável, quando observado sob o corte de uma Ideologia do Imbecil Coletivo, termo cunhado pelo brilhante pensador Olavo de Carvalho. Comparativamente, ainda, vejam-se estes outros parâmetros: (1) na I Guerra Mundial houve um total de baixas da ordem dos 11 milhões; (2) na II Guerra Mundial, esse número ascendeu a pouco mais de 72 milhões; o conflito USA-VIETNÃ ceifou a vida de aproximadamente 1,5 milhão de vietnamitas (civis e militares) e 60 mil militares norte-americanos; (3) na Guerra Civil Chinesa (1928-1936) houve um total de baixas de 2 milhões de militares; na segunda versão desse conflito entre nacionalistas e comunistas (1946-1949), o número de baixas alcançou quase 3 milhões; (4) os dois conflitos armados sino-japoneses (1894-1895/1937-1945) ceifaram uma média de 2,5 milhões (dos quais 500 mil eram comunistas) [[vii]]. Grosso modo, todos estes conflitos não alcançaram o total de mortos pelo regime comunista exposto no quadro destacado acima; praticamente, chegaram apenas mui próximo dos 100 milhões de vítimas (93,7 milhões de mortes). Comparativo que remete a sérias reflexões a partir de uma questão: quem matou mais até agora, o regime comunista ou o somatório dos demais conflitos – as duas Grandes Guerras e os conflitos localizados –? A resposta está claramente expressa nos números acima, desde que considerada criteriosamente a variável que interfere em cada grupo de conflitos: os derivados do comunismo são puramente ideológicos (o que, convenhamos, é um absurdo contrassenso), enquanto os outros se fundam em raízes marcantes de disputa territorial, disputa pura de poder político hegemônico, etc.
Abrindo um breve parêntesis, necessário destacar-se que a belicosidade é parte inerente ao ser humano, é uma falha de projeto (como defendo em minha tese de 1976: “O homem: esse projeto mal-acabado”) intimamente ligada à sua ânsia de poder, de sobreposição em relação aos seus semelhantes, de busca extenuante pela supremacia social. Esta característica, essencialmente humana, denota sua aversão à vida em sociedade, um dos grosseiros cancros que corroem a espécie. Em suma, ela é autodestrutiva e heterofágica (por simples analogia). Autodestrói-se e também destrói a vida em seu entorno, lato senso.
Daí que as palavras do jornalista José Reinaldo Carvalho – supracitadas – são inaplicáveis a estratos ideológicos específicos, visto sua asserção estar equivocada ao estratificar tendências político-ideológicas em de direita e de esquerda. Nada mais obtuso e infundado. Mera retórica andrajosa que serve aos interesses vis do espúrio sectarismo comunista e todo o seu aparato alienante. Desafio o leitor a que exponha, com exemplos concretos e incontestáveis, uma (e apenas uma) nação regida pelo sistema comunista que seja representativa de um modelo social irretocável, justo, equânime – como apregoam os discursos ensandecidos dos falsos líderes dessa verdadeira seita fanática –. Não a encontrarão, simplesmente porque é utópica. China, Vietnã do Norte, Coréia do Norte, Rússia, Venezuela, Equador, apenas para ficar nestes exemplos emblemáticos, são nações conturbadas, ditatoriais, de governos truculentos e ensandecidos, cuja “justiça social” inexiste e, em seu lugar, erguem-se modelos de submissão total e incondicional da população aos desígnios nada louváveis dos seus mandatários despóticos. Onde reside, então, a “vantagem” (sic) de sua supervalorização em relação ao modelo capitalista? O silêncio é a melhor resposta.
À guisa de encerramento, vale duplamente sublinhar o maior paradoxo do discurso marxista-leninista: a grosseira dicotomia povo x governo. Ao povo cabe ser incondicionalmente submisso para fazer jus ao mínimo indispensável à sua existência (alimentação básica, saúde básica, educação básica, lazer básico...) e ao governo (e aos seus arautos) lhe é permitido extrapolar em todos os aspectos, a fim de poder satisfazer (sic) as necessidades básicas do povo. Curioso, não? Se o comunismo se apresenta como uma “ideia reguladora” (ao estilo de Kant), o marxismo colide frontalmente com essa concepção, ao defender sua tese de pretender ser um “movimento efetivo que suprime o estado atual das coisas” [[viii]], assumindo os contornos de uma crença moral, no sentido de autojustificar-se como ator da causa da emancipação de um povo. Algo deveras inusitado.
Concluo com uma reflexão:
Se o Estado e o capital (como afirma o pensamento comunista) pretensamente são responsáveis pela monopolização das forças da sociedade, a criação de um Estado controlado por um Partido (o comunista) não representaria similar monopólio das forças sociais, mas agora com o agravante da obediência cega e do trabalho escravo?
Com a palavra, o leitor.
Juan Y. Koffler A. é Professor Doutor, Cientista Jurídico-Social, Professor-Orientador Mestrado & Doutorado (Professor de Metodologia Científica da Investigação), Escritor, Sociólogo, Autor da tese de doutorado “O homem: esse projeto mal-acabado” (1976 – Universidad Complutense de Madrid), Autor de várias obras (“Ira dos Tempos”, “Central de Negócios”, “Empresa ou Inferno Familiar?” [organizador/revisor], “Direito à Vida, Direito à Morte” [em revisão, no prelo], dentre outras), Articulista internacional, Tradutor Trilíngue. Contato: johnny.koffler@gmail.com – Site: http://www.militar.com.br/blog-de-jkoffler-19592.
A Nova República (1985 - ...) é um constructo das três principais forças políticas nacionais (PT, PMDB e PSDB), que juntas dominam e dividem as esferas de poder, controlando, pois, a alocação de recursos para a implementação de investimentos e políticas públicas. Mais: essas três legendas administram praticamente metade dos municípios brasileiros, 2/3 dos Estados e têm as três maiores bancadas no Congresso. Isso significa que o poder político gravita em torno desses partidos, que denominamos de Cartel Político, a partir da literatura de ciência política.
Quando lemos na revista Época da editora Globo, que Marcelo Odebrecht pode derrubar a República, isso, em nossa interpretação, significa dizer que o Cartel Político está em xeque. Não à toa, as reações de políticos de alta envergadura de PMDB e PSDB foram tímidas desde a deflagração da 14° fase da Lava Jato. Já Lula, desesperou-se nos bastidores segundo notícias veiculadas pela imprensa.
Para entender a atual crise política, é preciso ter em vista que o PT ao longo dos últimos doze anos, tentou gradativamente emplacar sua agenda político-ideológica. Para isso, lançou mão do mensalão, com objetivo de aliciar bancadas não alinhadas no espectro ideológico, para obter maioria nas votações. O Petrolão foi, pois, uma continuidade agora ampliada, de não só ter a maioria esmagadora do Congresso, como também ter fontes eternas de financiamento de campanhas políticas, e em alguns casos também, para benefícios pessoais como atestado em depoimentos e condenações da Lava Jato. Enfatizamos que não temos a total dimensão desse mecanismo em outras estatais e partidos, pois até o momento a Lava Jato circunscreve apenas a uma estatal.
Concatenado a isso, na última eleição, tudo levava a crer que haveria alternância de poder dentro do Cartel, já que a Nova Matriz Econômica fracassara, debilitando o partido governante. Mas o PT, a fim de "fazer o diabo na hora da eleição" para vencê-la - frase proferida por Dilma em 2013 - , cruzou o Rubicão político ao lançar mão de uma campanha agressiva jamais vista na redemocratização contra sua adversária Marina Silva (PSB) e, depois, ao atribuir a Aécio medidas impopulares - cortes orçamentários/ajuste fiscal -, que a própria Dilma tomou após a eleição.
Outro aspecto importante foram as pedaladas fiscais, que tinham como objetivo adiar a crise econômica para 2015, o que deixou o PT ainda em condição de disputar a eleição de 2014. Sem pedaladas fiscais, indubitavelmente, uma parcela da atual crise econômica teria acontecido já em 2014, e assim, o PT não teria vencido as eleições. Soma-se a isso, a tentativa de knock-out que o PT fez ao fomentar a fusão do PSD-PL, a fim de esvaziar em parte o PMDB. Além, é claro, da aloprada tentativa de derrotar a candidatura de Eduardo Cunha à presidência da Câmara.
Esse cenário político fez ruir o que restava do presidencialismo de coalizão: divisão do poder com os devidos ônus e bônus na implementação de políticas públicas. Assim, o que dá sustentação ao débil governo neste momento, no fundo, é o Cartel Político, que no limite entende que uma ruptura seria péssima para a cúpula dos partidos (PT, PMDB e PSDB). Dessa maneira, sem o PMDB na base aliada, o país ficaria ingovernável; já o PSDB segue sendo um fraco líder da "oposição" e não canaliza a crescente insatisfação pública. Lembremos que a cúpula do partido tem algumas afinidades ideológicas com o PT, ficando a divergência maior, no campo administrativo-econômico. Além disso, os tucanos estão sendo eclipsados pelo triunvirato peemedebista (Cunha, Calheiros e Temer) que de fato governa o país, impondo no Congresso a pauta de votações. Mais: PMDB e PSDB já almejam ocupar parte do espaço do PT nas eleições municipais de 2016 e estão em franca disputa por 2018, enquanto o petismo sangra frente a opinião pública. Logo, todo esse cenário de caos interessa ao PMDB e PSDB.
Portanto, a crise política que vivenciamos é, na verdade, por disputa de poder dentro do Cartel, claro sem que haja ruptura política irreconciliável entre os membros. Num cartel, por definição, todos tem "amarras" e também se ajudam, inviabilizando a aparição de novas forças políticas que não as próprias. Mas existe uma variável exógena nesse modelo operacional do Cartel não vislumbrada com a devida atenção: o Dr. Sergio Moro e os procuradores do MPF do Paraná. Eles, através de investigações e delações, estão quebrando o cartel das empreiteiras sem ainda ter tocado diretamente na esfera política, já que não possuem jurisdição para tal - políticos têm foro privilegiado (STF). Posto isto, hoje quem pode desarticular o Cartel Político se chama Marcelo Odebrecht, que se abrir o jogo implode a Nova República, pois pelas denúncias até o momento, mostra uma intimidade muito grande com o atual governo (PT-PMDB) e que pode também respingar na oposição formal (PSDB). Em suma: é dentro desse contexto que sugerimos a leitura da matéria de capa que a revista Época publicou neste fim de semana. Enquanto isso, o Brasil, em meio a incompetência administrativa de Dilma e a briga dentro do Cartel Político, caminha a passos largos para o buraco político-econômico-institucional.
Diante desse cenário, a Nação precisa de um choque de gestão e de credibilidade. Precisa, portanto, de um novo governo. O impeachment não é uma bomba atômica, como disse FHC. É, sim, um instrumento constitucional de proteção da sociedade e das instituições, e que funcionou muito bem em 1992. Com certeza, agora levaria a uma reorganização das forças políticas no Congresso. E que nas eleições de 2018, o Brasil possa ter a necessária oxigenação na esfera política.
Cristiano Rodrigues Economista (USP) / Ciência Política Vinícius Gouveia Economista (USP) / Ciência Política