• Gavroche Fukuma
  • 10/10/2015
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COMO O NEW YORK TIMES CHEGOU A 1 MILHÃO DE ASSINANTES DIGITAIS?

 

Enquanto as redações brasileiras vão encolhendo e ceifando seus melhores profissionais para reduzir os custos com a produção de conteúdo, o New York Times comemorou, três dias atrás, o fato de ter ultrapassado a marca de 1 milhão de assinantes na sua plataforma online. Além disso, em uma espécie de carta de agradecimento aos seus leitores, o jornal também se gaba por ainda manter o mesmo número de repórteres que já possuía há 15 anos.
Mas o que explica uma diferença tão grande entre um país e outro?

Imagino que sob um ponto de vista menos refinado, poderia arriscar que isso é decorrência da maturidade de cada um dos mercados. Se pensarmos em livros, o brasileiro lê em média 1,7 livro por ano, contra 5,1 livros dentre os norte-americanos. Em termos de jornais, apenas 7% dos brasileiros afirmam ler jornais diariamente, seja online ou off-line. Nos Estados Unidos, a Newspaper Association of America estima de 7 em cada 10 americanos leem jornal, impresso ou digital, todos os dias da semana. Ou seja, nossa falta de hábito para leitura parece emperrar o crescimento do setor como um todo.

Outra diferença perceptível é a de que o consumidor de conteúdo no Brasil se acostumou com o modelo gratuito. Poucos, mas muito poucos mesmo, se mostram interessados em pagar para ter acesso a conteúdos exclusivos.
A lógica relatada pelo New York Times para explicar o seu sucesso segue o suspense do jornalismo americano. O artigo começa contando que no dia em que a Suprema Corte Norte-Americana decidiu pela legalidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo, o repórter do NYT que estava cobrindo o evento era um advogado formado pela Universidade de Yale. “Nosso repórter que noticiou a descoberta de armas químicas abandonadas no Iraque, era um ex-capitão dos fuzileiros navais. A equipe que cobriu os ataques ao Charlie Hebdo incluía 8 correspondentes em Paris, todos fluentes em francês. Nosso jornalista que realizou um estudo completo sobre a diferença de renda no país, já havia trabalhado para o Federal Reserve”, completa o NYT para explicar o quão qualificados e especializados são os seus jornalistas.

É claro que o Brasil seguiu durante muitos anos a exigência de registro profissional de jornalista em suas redações, mas essa é uma outra discussão. O que me parece evidente, é que uma pessoa que entende profundamente sobre determinado assunto, tem mais chances de criar análises interessantes e bem elaborados sobre o tema. Aliás, se partirmos do princípio de que hoje em dia qualquer pessoa com um celular na mão pode produzir imagens e noticiá-las, resta aos jornais a profundidade da cobertura que se preocupa em ir além do fato, em buscar a explicação, em ser um formador de opinião.

Seguindo a lógica do NYT, ao produzir conteúdo de alta qualidade, mais pessoas se interessam por assinar seus serviços, buscando assim o acesso a coberturas que vão além da rasa profundidade de uma lâmina d’água. As pessoas não se incomodam, pelo menos nos Estados Unidos, de pagar para receber um material tão valioso quanto este.
Assim o jornal enche os bolsos de dinheiro para mais tarde, com parte dessa arrecadação, fazer o pagamento de seus profissionais tão preciosos, que felizes continuarão a fazer aquilo que sabem de melhor: jornalismo de qualidade. Ao ver matérias tão legais sendo produzidas, mais pessoas se sentirão compelidas a assinar o jornal; e assim o NYT cria um círculo que parece até a propaganda de Tostines.

Enquanto isso, no Brasil, nossas redações vão sendo “diminuídas”, tanto em tamanho quanto em qualidade, sem oferecer a grande experiência que eu tive na minha vida profissional: ser foca de feras do jornalismo para aprender com quem tinha muito a ensinar. Nossos focas estão sendo jogados em mares turbulentos e cheios de tubarões. Alguns sobreviverão e virarão grandes profissionais, aprendendo entre erros e acertos. Outros, infelizmente, serão acusados, julgados e culpados pelo declínio no número de assinaturas de seus veículos.

Desculpem pelo texto longo que não traz solução nenhuma, mas achei interessante compartilhar, afinal, deu no New York Times.