Percival Puggina
Iniciou o julgamento politicamente mais importante deste século no Brasil. Sua importância vem da magnitude dos crimes? Não. Vem da solidez da narrativa que os descreve? Não. Vem da exuberância e veemência das provas? Não. Vem da esmerada condução processual? Não. Vem de sua necessidade para o momento histórico nacional? Não, três vezes não. Bem ao contrário. O processo caminha para seu final acompanhado por denúncias de violações de direitos humanos, de ter instituído o direito penal do inimigo e assim tratado os réus, antecipando julgamentos, construindo versões e imagens em consonância com o viés político assumido pela Corte ao longo dos últimos 14 anos.
Um ambiente soturno rondou essa ação penal. Houve, inclusive, momentos de Família Adams, nos quais o Tribunal agia como se não tomasse conhecimento da opinião pública, mas falando a ela sem parar, impondo uma narrativa e sugerindo culpas antes mesmo de estar a investigação conclusa e de ter a PGR oferecido a denúncia. Advogados dos réus relatam obstáculos processuais que a tudo faziam penoso, inacessível, em meio à obscuridade de perguntas incômodas ficarem sem resposta. Aliás, ignoradas ficaram, também, as denúncias das Vaza Togas que ganharam novo capítulo em sessão de ontem na CSP do Senado Federal.
O Brasil e o mundo sabem que os manés perderão e tudo sugere que seu principal líder será condenado à mais extravagante das penas.
Arrisco aqui minha opinião sobre o que se pode esperar das futuras páginas dessa história já redigida nas linhas enigmáticas das artimanhas juspolíticas. Quem exerce com tamanha facilidade um poder descomunal vai ficar por aí, parar tão longe do fim? Nunca houve poder assim! 11 ministros em suas togas impuseram-se aos demais entes do Estado e sobre a nação. Como? Transformando o que era um poder sob a Constituição, num poder sobre a Constituição, atributo que ela não concede a qualquer dos poderes que institui. Transformaram a Carta de 1988 numa caixa de ferramentas de valor privativo e uso reservado. Nessa nova ortodoxia, ninguém pretenda lê-la e interpretá-la. Parece ser conteúdo de uso exclusivo da Corte. Há meses avisaram que derrubarão a anistia...
Daí meu receio: aqueles que realizarem feito de tais proporções, nas circunstâncias do tempo presente, desfilarão atrás das fanfarras da vitória. Poderão, inclusive, arrastar 213 milhões de brasileiros para um completo desvio de rota. Poderão levá-los a companhias que não guardam relação amistosa com a democracia nem com os direitos dos cidadãos. Tal menção, aliás, foi proibida na eleição de 2022, lembram?
Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.