Artigos do Puggina
Percival Puggina
30/04/2025
Percival Puggina
O país é maravilhoso. O território, uma dádiva que evidencia a nacionalidade do Criador. Aqui, o trabalhador trabalha e o empreendedor empreende, mas a superestrutura estatal é uma vergonha. De cima para baixo, a Política é um desastre moral e operacional e a Justiça se politiza a olhos vistos; se houver para a palavra “politização” um sentido bom, não se aplica ao caso. O Estado empobrece a sociedade comendo a galinha nos almoços e os ovos de ouro nos jantares; suga e engessa o empreendedorismo, inibe a empregabilidade, instrumentaliza ideologicamente a pedagogia; a Educação é um fiasco, a cultura se degrada e a ignorância tem futuro. A dívida gerada pela falsa prodigalidade estatal não perdoa nem o nascituro. Ao berçário, o brasileirinho já chega endividado. Por essas e tantas outras, em 2023, cinco milhões de conterrâneos viviam no exterior e em 2024 outros 400 mil foram construir suas vidas fora daqui.
Penso que essa breve e ríspida introdução deixa claro o quanto é tenebroso por conta própria o território da política, onde a cúpula do Poder Judiciário foi buscar espaço e protagonismo, com intervenções que marcam de modo controverso a história desta última década. Eventos, aliás, que seus ministros mais falantes descrevem como se fossem observadores neutros, aparentando ignorar o peso determinante de sua própria atuação.
Nem mesmo os préstimos do Consórcio Goebbels de Comunicação, recitando a narrativa oficial como mantra, ao longo de mais de dois anos, conseguiu impedir que a sociedade desenrolasse o pacote acusatório e percebesse a distância que separa o muito dito do pouco realmente feito antes e durante o 8 de janeiro. Recentíssimo levantamento de opiniões elaborado por Paraná Pesquisas mostra que apenas três em cada dez brasileiros consideram ter ocorrido um golpe de estado no início de 2023, sendo conveniente prender essas pessoas por muitos anos. Ou seja, o mantra oficial levou um “capote” e a ninguém mais convence!
Quando a Política e o Direito se entreveram num formato híbrido, para não dizer promíscuo, ambos ficam lesados! Reiterei essa convicção assistindo a sessão da 1ª Turma do STF que tornou réus os acusados correspondentes ao Núcleo I do inquérito relativo aos eventos. Ficou evidente a semelhança entre o que assistia e os muitos julgamentos políticos em regimes totalitários que o cinema, felizmente, vem exibindo como gritos de alerta que cruzam os tempos. Vi o mesmo ânimo nos julgadores, os mesmos tribunais acusadores, as mesmas ironias e o mesmo tom pouco condizente com o serviço da verdadeira justiça. Vi o ministro relator exibindo um compacto de cinco minutos que recortou cenas de vandalismo ocorridos naquela tarde e fiquei pensando em quantas horas de projeção teria um filme com todas as cenas de conduta cívica pacífica, que poderiam ser obtidas na mesma praça, na mesma hora! Pessoas caminhando, subindo à cobertura, conversando, rezando, cantando hinos, tirando fotos. Pessoas gritando “Não quebra!” quando os vândalos iniciaram seu ruinoso trabalho. Para mim, a parcialidade da seleção de imagens feita pelo ministro relator fortaleceu a convicção pró anistia e evidenciou a inadequação da Corte para tais julgamentos.
Então, chegou a hora de perguntar às bases de sustentação do regime se já precificaram os objetivos de hoje a médio e longo prazo, bem como seu dano aos mais carentes e às gerações futuras. A nação, senhores, já descrê de si mesma e das instituições! A estas alturas, até quem ainda faz o L sabe quanto a inflação está roubando do produto de seu trabalho, vê quanto mês já sobra no fim do dinheiro e vê a corrupção voltando.
O Brasil é um país maravilhoso e o Estado é seu problema!
Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.
Percival Puggina
27/04/2025
Percival Puggina
Os animais que divertem as crianças num zoológico são os mesmos que a imaginação infantil, na escuridão da noite, transforma em monstros assustadores. Elas se acalmam quando a luz do quarto é acesa porque, como disse alguém, só a luz vence as trevas.
É sob o domínio do medo que povos vivem sua hora mais escura. Medo que a luz do dia não afasta. Ao contrário, esclarece melhor suas causas e seus efeitos. Onde mais evidente a tirania, onde mais sombria a noite dos tempos, mais binário, recíproco, é o medo, mais necessários se fazem e mais reduzidos ficam, em número, os homens virtuosos.
Fidel Castro, por exemplo, tinha um sósia – Silvino Alvarez – que desfilava de carro pelas ruas de Havana simulando popularidade enquanto, na prática, a semelhança era seu meio de vida, ou de morte. Um alvo de aluguel, abanando sorridente. Embora Ponto Zero fosse sua moradia oficial, o tirano tinha vários domicílios na cidade. Usava uma escolta de 14 guarda-costas em quatro viaturas e nunca se sentiu seguro, mesmo tendo se livrado dos três ex-comandantes da revolução que o superavam em popularidade. Ainda em 1959, Camilo Cienfuegos morreu num misterioso “acidente” aéreo e Huber Matos. por ser anticomunista, foi condenado a 30 anos de prisão integralmente cumpridos. A revolução tinha apenas sete anos quando Che Guevara foi enviado à Bolívia para uma missão abortada, na qual o executaram.
Da tirania à paranoia é um passo de dedo. A autoestima narcisista, que chega a autoadoração e se protege com violência, sabe que, de modo simétrico, cresce a repulsa social. Vem daí a rejeição à mínima divergência, o delírio persecutório e as teorias ou narrativas sobre conspirações que ensejam penas brutais. Mussolini, Hitler, Mao, Saddam, a coreana dinastia Kim e tantos outros unem-se pelas mesmas características.
Na Rússia Soviética, com Lênin e Stalin, sempre havia muitos a prender e executar. Afora os milhões de mortos por etnia errada, profissão errada, crença errada, visão de mundo errada e opinião errada, também os grevistas, críticos e adversários eram submetidos a julgamentos fajutos, enfiados em balsas com pedras no pescoço e jogados no rio Volga.
Tiranias não moderam a si mesmas. Sua dinâmica é bem outra. Mantendo-se pelo medo que suscitam, é natural que, na mesma proporção, cresça o medo da reação da sociedade. O medo de uma parte faz crescer o medo da outra e vice-versa. A insegurança se torna condição comum e franquia instalada a todos os excessos e abusos.
De quanto pude puxar da memória não lembrei de qualquer caso em que uma tirania tenha se deixado extinguir. Elas só se encerram por causas externas ou por falência estrutural dos sistemas que as sustentam.
Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.
Percival Puggina
23/04/2025
Percival Puggina
Entendi perfeitamente o ministro presidente do STF, Luís Roberto Barroso, quando se referiu ao populismo autoritário em videoconferência dirigida a evento brasileiro na Universidade de Harvard. Populismo autoritário, no vocabulário do ministro, é uma síntese elegante para tudo que não presta. O que pensar de ruim se encaixa na moldura, mais ou menos como, de modo rasteiro, o esquerdismo universitário faz com a palavra fascismo e com o adjetivo fascista. Democrático, por outro lado, é tudo que ele aprecia, incluídas as descriminalizações do aborto e do porte de drogas para uso pessoal.
Claro que isso também soa como autoritário quando decidido à margem do Congresso Nacional. Impossível não perceber a manipulação de conceitos em modo discursivo, criando ilusões, como a do grão de ervilha em três cascas de noz. O autoritarismo sempre está onde interessa na hora do discurso. Por isso, quando fala sobre aborto, o ideal democrático correspondente considera a sociedade brasileira ainda despreparada para tratar do assunto... e decide por ela. Decide que feto com três meses está pronto para morrer.
Imagino, então, que o oposto do populismo autoritário deva ser um elitismo iluminista, civilizador, que decide por todos, visto que o atributo ignorância não pode ter peso numa democracia de excelência (ou seria melhor dizer “de excelências”?).
O que mais me chama a atenção na fala do ministro não é tanto o que diz, mas o silêncio sobre o alinhamento de nosso país com China, Irã, Cuba, Venezuela, Nicarágua, Hamas e com organizações políticas do Foro de São Paulo. Algumas destas últimas chegaram ao poder e se afundaram nas negociatas verde-amarelas da Odebrecht, proporcionadas bem se sabe por quais influências. Será que aos olhos e cuidados proativos da atual composição do STF, esses parceiros não se caracterizam como extremistas nem autoritários, nem populistas? Transitam, então, sob simétrico silêncio, as consequentes rupturas, por desalinhamento, com nossos históricos parceiros do Ocidente civilizado e democrático. Meninos de Harvard, it’s complicated.
O iluminismo elitista nada diz sobre a mácula do descrédito que exceções e excessos causaram às instituições republicanas. Nem sobre a notoriedade mundial a que se alçou a ação política da instituição, por meios próprios, com estupor externo e apreensão interna.
Com a devida vênia, é impossível não comparar a conferência do ministro em Harvard com a história do sujeito que, no confessionário, se jactou de seus pecados.
Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.
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